São Paulo, quarta-feira, 17 de maio de 1995
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Computador recria a voz de "castrato"

TARA PATEL
DA ``NEW SCIENTIST"

Os computadores reinventaram a voz de um cantor de ópera do século 18 para um filme sobre sua vida -``Farinelli, Il Castrato"-, que está em cartaz em São Paulo.
Nenhum artista contemporâneo foi capaz de recriar seu repertório ou a incrível extensão da sua voz -e é pouco provável que alguém tente fazer isso.
O italiano Carlo Bronschi, mais conhecido como Farinelli, foi um dos mais famosos cantores ``castrati", isto é, castrados antes da puberdade para que sua voz se desenvolvesse nas extensões de contralto e soprano (vozes femininas).
A trilha sonora do filme ``Farinelli, Il Castrato", produzida pelo belga Gerard Corbiau, foi tornada possível no Instituto de Pesquisa Acústica e Musical, de Paris.
Computadores produziram uma voz única a partir das vozes de um contratenor e de uma soprano.
Os ``castrati" eram escolhidos entre os meninos cantores e treinados intensivamente para que suas vozes ficassem mais poderosas.
Sua extensão de voz chegava a três oitavas e meia e suas cordas vocais, muito flexíveis, permitiam que cantassem escalas em cascata e trinados com grande velocidade.
Documentos indicam que Farinelli, que viveu de 1705 a 1782, podia sustentar uma nota por mais de um minuto e cantar passagens de mais de 200 notas sem, aparentemente, tomar fôlego.
Xavier Rodet, diretor de pesquisa do Instituto de Pesquisa Acústica e Musical, diz que existe uma única gravação conhecida de cantor castrado -a castração foi proibida por lei no século passado.
Os cantores líricos Derek Lee Ragin e Eva Godlevska foram escolhidos para recriar a voz de Farinelli por causa das semelhanças entre suas técnicas vocais.
Godlevska cantou as notas agudas e Ragin, as graves. Os dois cantores gravaram suas passagens separadamente -trechos às vezes muitos pequenos, constituídos de uma única nota. Essas passagens foram depois ``costuradas" segundo a música original.
Cada cantor tem um timbre, ou qualidade de som, característico. A essa altura do processo, a gravação era inaproveitável porque as diferenças entre as duas vozes ainda eram perceptíveis.
Com uma técnica que o Instituto de Pesquisa Acústica e Musical chama de ``morphing" -um termo emprestado da fotografia e que significa transformar uma imagem em outra-, o timbre de Godlevska foi igualado ao de Ragin.
O instituto analisou os timbres das duas vozes decompondo-as em volume, espectro e frequência.
Isso foi feito a cada trecho de som de quatro milésimos de segundo e a cada som vocálico, permitindo que o timbre e a intensidade da voz de Godlevska fossem modificados.
Os engenheiros aperfeiçoaram, então, o timbre fundido resultante, dando-lhe mais força e brilho.
O instituto empregou técnica computadorizada para criar notas extralongas que um cantor contemporâneo não sustentaria.

Tradução de LUCIA BOLDRINI

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