São Paulo, domingo, 21 de maio de 1995
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Taxa de juro na estratosfera confirma poder de Malan

CARLOS ALBERTO SARDENBERG
DA REPORTAGEM LOCAL

No início de abril, o presidente Fernando Henrique Cardoso ouviu de um ministro, e também amigo de longa data, uma crítica e uma sugestão. A crítica: a política econômica estava com o comando dividido e, por isso, sem direção clara. A sugestão: concentrar o comando no ministro do Planejamento, José Serra, que parecia ter mais apetite.
O presidente admitiu a crítica, mas dispensou a sugestão. E informou a seu colaborador que já havia tomado providências: o comando seria unificado, mas quem deveria assumí-lo era o ministro da Fazenda, Pedro Malan.
O que aconteceu de lá para cá confirma essa história. No aspecto externo, Malan tornou-se mais ativo na imprensa e apareceu cada vez mais como o ministro do real.
Dentro do governo, houve um movimento paralelo. É Malan, por exemplo, quem convoca as reuniões da equipe para discutir os novos passos do programa.
Mais importante de tudo, porém, é o rumo da política econômica. As mais recentes medidas tomadas por Malan e pelo presidente do Banco Central, Pérsio Arida, refizeram a aposta original do Plano Real. A seguinte: o objetivo é eliminar a inflação, tudo o mais se submetendo a essa prioridade.
E essa aposta precisava mesmo ser refeita.
Depois da desastrada desvalorização do real em março, seguida de medidas de restrição a importações de carros e eletrodomésticos, surgiu nos meios econômicos a interpretação de que os fundamentos do plano haviam sido abandonados.
Em vez do dólar barato e com cotação estável, a âncora cambial que barateava importações e impunha redução de preços dos produtos nacionais, o governo teria optado por desvalorizações do real de modo a estimular exportações, encarecer importações e assim garantir superávits comerciais.
Em vez da abertura da economia, que forçava a competição, o governo teria optado pela proteção à indústria aqui instalada.
Por essa interpretação, o governo passaria a tolerar alguma alta da inflação para obter resultados de comércio externo, dar apoio à indústria local e sustentar o crescimento. Como isso era uma reivindicação do empresariado, e especialmente o de São Paulo, que elegeu Serra como seu representante, passou-se facilmente à conclusão de que o ministro do Planejamento conquistava o comando.
Publicamente, Serra nunca endossou ou estimulou essa interpretação. Mas ela se generalizou.
Isso era início de abril, quando a inflação estava em alta e se discutia se a economia estava ou não muito aquecida. Malan e Arida diziam que sim e que não podia continuar assim pois isso seria fatal para o Plano Real.
O empresariado dizia que não e sustentava que poderiam suprir o aumento de compras. E José Serra dizia que era preciso dar um tempo para observação.
O pacote anticonsumo viria a sair em 27 de abril, mas no início desse mês já se ouvia, na Fazenda e no BC, que a disputa terminara favoravelmente aos que defendiam a contenção da economia.
Iniciado maio, o quadro de política econômica mostrava-se bastante diferente de um mês atrás. Na área externa, ficava claro que âncora cambial continuava lá.
Na área interna, o BC entrou maio sustentando a taxa de juros altíssima e arrochando como nunca se viu os mecanismos de concessão de crédito. E a inflação, depois de ter subido em março e abril, dava sinais de queda.
Ficou tudo muito parecido com a partida do Plano Real, em julho de 1994, quando os juros foram para a estratosfera.
Na ocasião, como hoje, os empresários diziam que o país caminhava para a recessão. A equipe econômica, como hoje, sustentava que a prioridade era derrubar a inflação e mantê-la lá embaixo. E quando isso se estabilizasse, os juros cairiam, como caíram. Vai ser de novo assim, dizia Pérsio Arida na última sexta-feira, afirmando ter sinais claros de queda da inflação e desaquecimento da economia.

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