São Paulo, domingo, 21 de maio de 1995
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Quem paga a conta é o povo

OSIRIS LOPES FILHO

Passado o entusiasmo dos dias iniciais do governo federal, alguns ministros têm sentido que, entre a mão que deseja colher e a maçã oferecida, tem o muro. Muro da realidade. Realidade da escassez de recursos, principalmente os financeiros.
O desejo de realizar coisas, inviabilizado pela carência dos meios financeiros, enseja tentativas canhestras, simplórias e mesmo perversas, como a idéia de recriar um novo imposto, tipo IPMF (Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira).
Inicialmente, a recriação do IPMF foi concebida para atender a meritórias necessidades na área do Ministério da Saúde.
Afoito, o ministro da Agricultura postulou que, se for para restabelecer o IPMF, a sua área merece a metade da arrecadação produzida. Afinal, o país tem fome e quem proporciona alimentação é o seu setor.
Se esta concepção de ressurreição do IPMF ganhar força, vai haver uma fila de setores necessitados a postular uma parcela de sua arrecadação.
Entre estes setores podemos citar educação, transporte, desenvolvimento regional, enfim, as carências vão desfilar e chorar os seus pleitos.
E, aí, haverá uma classificação das prioridades que a história orçamentária do país demonstra que são menos estabelecidos por critérios técnicos, do que por critérios políticos.
Em verdade, os orçamentos no Brasil têm se caracterizado por serem realizados com base em um critério singular. Primeiro, estabelecem-se as despesas, para depois se buscarem as receitas que vão cobrir os gastos que foram previstos.
Daí o sufoco, a cada ano, de se procurarem recursos adicionais para atendimento das despesas inadiáveis e imprescindíveis estabelecidas anteriormente.
Pulverização de recursos, gastos clientelísticos, corrupção, falta de controle no emprego dos recursos públicos, superfaturamento das obras e serviços. A lista das deficiências da atuação estatal nesse campo minado é longa e triste.
Numa época de mudança, o prioritário, em matéria de gastos públicos, não é se promover cortes lineares em todas as despesas. O que cumpre realizar é discutir a prioridade, a necessidade, a conveniência e oportunidade dos gastos previstos. Discutir-se cada item da despesa.
A Lei de Diretrizes Orçamentárias consistiria em uma medida fundamental à estruturação do Orçamento, se fosse efetivamente para valer, com orientações factíveis, que correspondessem a um disciplinamento, que atendesse às peculiaridades de cada ano fiscal.
No caminho em que vai, a LDO está se tornando mais um prodígio legislativo da tecnoburocracia federal e, cada vez menos, uma bússola e uma orientação política de gastos da União no exercício financeiro seguinte.
É hora de se reformar essa tradição trágica de se gastar mais do que se tem e, principalmente, passar-se a conta dos gastos excessivos para que a população a pague, por meio de novos impostos ou da elevação dos tributos já existentes.
O governo federal, que na campanha eleitoral assumiu o compromisso de mudança, deve cuidar da administração do país, principalmente na sua área de atuação.
Melhorar a sua prestação de serviços, aperfeiçoar seus mecanismos de execução, atender às demandas da população são funções do Estado.
Pode ser que as reformas constitucionais no âmbito da ordem econômica, propostas pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, sejam aprovadas. Se o forem, vão deixar felizes e satisfeitos os investidores nacionais e estrangeiros.
Mas o povo, que há muito tempo espera por melhores dias, vai continuar na mesma. A esperar, quase sem esperança, pois este governo pouco tem feito para satisfazê-lo.

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