São Paulo, domingo, 21 de maio de 1995
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Lei do cão

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - A nomeação do deputado-general Cerqueira para combater a violência no Rio, segundo leio nas folhas, obedeceu ao critério neoliberal dos resultados, da eficiência, da capacidade. Sua bem sucedida passagem pelo Doi-Codi habilitou-o a esse tipo de tarefa. A história oficial dos tempos da repressão credita-lhe um fato ilustre: ele perseguiu e matou um dos líderes da subversão.
Nesse episódio, dentro da Lei do Cão que funciona em certos momentos da aventura humana, Cerqueira fez aquilo que julgava sua obrigação. Se Lamarca não estivesse doente, e dormindo, na certa haveria duelo e, fosse qual fosse o sobrevivente, estaria cumprida a Lei do Cão. Quem acredita que o general é eficiente, pode citar a façanha.
Mas há outra façanha na biografia do novo Secretário de Segurança do Rio. Ele participou do atentado ao Riocentro, e não de forma passiva como alguns alegam. Cerqueira sabia da maquinação diabólica que poderia matar centenas de pessoas. A maioria era constituída de jovens que não ameaçavam duelo nem perigo ao regime de então. O estrategista da operação desejava boçalmente matar centenas de jovens para atribuir o morticínio à esquerda.
A polícia do Estado, então sob o seu comando, foi mantida afastada do pavilhão. A versão oficial do atentado é, de longe, a maior vergonha daquele estrebuchar do governo militar.
O caso do Riocentro tornou-se mais repugnante do que o da morte de Lamarca -que pode ser considerado um episódio da chamada guerra revolucionária. Foi uma lambança criminosa que revela o grau de inteligência e eficiência de seus autores.
Outro ponto da biografia do general-deputado-secretário que está sendo louvado: o combate aos bicheiros. Quem botou a cúpula do bicho na cadeia não foi ele, foi uma juíza, anos depois da passagem do general pela Secretaria de Segurança.
Para todos os efeitos, passado é passado. Esqueçamos tudo o que Cerqueira foi (não sei se ele chegou a escrever alguma coisa, mas se escreveu, esqueçamos também).
Aguardemos os resultados.

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