São Paulo, domingo, 21 de maio de 1995
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gol no Oriente

MÁRIO MAGALHÃES

a fitá-lo. Mudou de lugar no vagão, mas o misterioso "voyeur" o seguiu.
Preocupado, Zico trocou de vagão, mas não foi abandonado. Assustado, desceu e esperou o trem seguinte. Não adiantou -o incômodo companheiro de viagem não desgrudava.
Apavorado, Zico embarcou em outro trem, no sentido oposto ao seu destino original. Algumas estações depois, saltou aliviado, quando sentiu um dedo em suas costas. Virou-se e o japonês perguntou-lhe, desajeitado, se ele era mesmo Zico.
Surpreso por ser reconhecido, o jogador assinou o autógrafo pedido e foi embora. Poucos passos adiante, só para se certificar de que se livrara do fã, Zico virou discretamente a cabeça. Socando o ar com o punho fechado, como num gol de Pelé, o japonês comemorava aos pulos.
Só virtudes Três anos após o caso do trem, os zicos se multiplicaram por dezenas e os perseguidores viraram milhões. Nenhum país exporta tantos jogadores para o Japão como o Brasil. Atletas japoneses não são populares como brasileiros radicados lá.
A chegada de Zico ao Japão, em 1991, deflagrou a moda, embora desde os anos 50 jogadores tupiniquins batam bola no país.
O ano em que Zico chegou, coincidentemente, foi marcado por um crime de repercussão nacional no Japão. O imigrante brasileiro Terumi Maeda Júnior estrangulou uma vizinha em Fujioka, ao norte de Tóquio.
Caso Maeda O futebol ajudou a sarar a imagem arranhada do Brasil no Japão, ligada também ao trabalho ilegal e sub-remunerado dos imigrantes. Agora, em 1995, os dois países comemoram 100 anos do Tratado de Amizade, Comércio e Navegação, o equivalente ao início de relações diplomáticas.
A febre do futebol no país do sumô causou um fenômeno improvável, surpreendente e talvez único no planeta: na terra do sol nascente, TV, jornais e revistas dedicam espaços e tempos generosos a exaltar as virtudes do Brasil. Às vezes, é como se só existissem virtudes.
Mais: país da qualidade-total, da hipereficiência e da dedicação ao trabalho, o Japão reconheceu nos jogadores brasileiros um emblema de talento -isso há muito se sabia- e, acredite, de profissionalismo.
"Na Alemanha, eu só via notícias do Brasil sobre violência urbana e crianças de rua", conta o carioca Jorginho. "No Japão, só vejo falarem bem. Em fevereiro do ano passado, ele trocou o clube alemão Bayern, de Munique, pelo japonês Kashima Antlers. Não se arrepende.
O niteroiense Leonardo deixou o São Paulo em julho passado para se juntar a Jorginho. ``Parece que os japoneses têm no Brasil um ideal de modo de vida", analisa Leonardo.

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