São Paulo, segunda-feira, 22 de maio de 1995
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Eleição na CNBB teve panfletos e boca-de-urna

FERNANDO MOLICA
ENVIADO ESPECIAL A INDAIATUBA (SP)

Embora falem o tempo todo em unidade e convergência de idéias, as lideranças que participaram da assembléia da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) conchavaram, armaram estratégias eleitorais e se articularam para derrotar seus adversários.
``Fizemos muita boca-de-urna", disse à Folha um dos principais articuladores dos ``progressistas", uma espécie de ``esquerda" eclesiástica.
``Sou nota oito em articulação, mas há quem diga que sou nota dez", dizia, orgulhoso, d. Amaury Castanho, líder ``conservador" e bispo-coadjutor (auxiliar) de Jundiaí (SP), principal artífice da vitória de d. Lucas Moreira Neves para a presidência da CNBB.
Encerrada na sexta-feira em Indaiatuba (a 100 km de São Paulo), a assembléia elegeu a nova direção da entidade (três cargos na presidência e nove na Comissão Episcopal de Pastoral) e definiu suas diretrizes para os próximos anos.
As correntes divergiam nos candidatos e nas idéias, mas empatavam nas estratégias. As chapas de candidatos eram refeitas a cada mudança do contexto eleitoral.
O bispo de Santo André (SP), d. Cláudio Hummes, era o candidato dos ``conservadores" (a ``direita" da igreja) para o cargo de secretário-geral da CNBB, o segundo em importância na entidade.
Liderados por d. Amaury Castanho, eles perceberam que mesmo entre os adversários havia uma maior aceitação ao nome de d. Raymundo Damasceno, bispo-auxiliar de Brasília.
``Promovemos d. Cláudio a candidato a vice-presidente", afirmou d. Amaury para explicar o rebaixamento do bispo de Santo André na hierarquia da chapa.
D. Raymundo foi eleito para secretário-geral com cem votos de diferença sobre o adversário. D. Cláudio foi derrotado na disputa da vice-presidência.
Panfletos
Derrotados na disputa pela presidência, os ``progressistas" se rearticularam. Reunidos por d. Waldyr Calheiros, de Volta Redonda (RJ), cerca de 30 bispos se juntaram na noite de segunda-feira, mudaram a lista de candidatos e começaram a panfletar a nova chapa, com a distribuição de pequenos folhetos.
Oficialmente não há chapas nas disputas na CNBB: na prática elas existem e servem para orientar os simpatizantes a descarregar votos nestes ou naqueles candidatos.
Na terça-feira, os ``progressistas" conquistaram oito das nove vagas na CEP e voltaram a sorrir.
``Como é que vocês avaliam este resultado?", perguntou aos jornalistas o bispo de Santa Maria (RS), o ``progressista" d. Ivo Lorscheiter, sem conseguir esconder sua felicidade.
Na quarta-feira, outra vitória dos ``progressistas": a derrota de d. Eugênio Sales, cardeal-arcebispo do Rio, na disputa pelo cargo de representante da CNBB no Celam (Conselho Episcopal Latino-Americano).
Além de conquistar mais uma vaga, eles tinham outro objetivo -apressar a aposentadoria de d. Eugênio. No final deste ano, o arcebispo completa 75 anos e, pelas normas da igreja, apresentará sua renúncia ao papa. Se fosse eleito para um cargo na CNBB, teria direito a voto na assembléia da entidade por mais quatro anos.
Dispostos a não dar chance ao velho adversário, os ``progressistas" cerraram fileiras em torno do então secretário-geral da CNBB, d. Antônio Celso de Queiróz, bispo-auxiliar de São Paulo.
Um dos bispos mais próximos do Vaticano, d. Eugênio é visto pelos ``progressistas" com um dos que mais contribuíram para azedar as relações entre a CNBB e o papa. No final, o bispo-auxiliar derrotou o cardeal: 163 votos contra 78. D. Eugênio foi obrigado a contentar-se com uma suplência.

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