São Paulo, quarta-feira, 24 de maio de 1995
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Escorchantes

O presidente Fernando Henrique Cardoso admitiu que os juros são ``escorchantes". O governador Mário Covas qualificou-os como inaceitáveis. O ministro Sérgio Motta reconheceu que a lógica dos juros altos é ``perversa". Apesar dessas constatações, é ainda incipiente a reorientação da política econômica.
A ligeira queda nos juros ontem é auspiciosa. Mas as declarações do presidente do BC, Pérsio Arida, mostram que esse movimento deve-se mais a pressões políticas do que a uma revisão de intenções.
Mesmo parecendo perceber que as taxas atuais podem inviabilizar o equilíbrio das contas públicas e prejudicar o setor produtivo, o governo mostra dificuldade em divisar uma política alternativa.
As recentes declarações do ministro Pedro Malan mostram insuficiências nas formulações oficiais. Ao mesmo tempo em que condicionou a queda dos juros ao avanço das privatizações e do ajuste fiscal, o ministro admitiu que as taxas atuais são insustentáveis por um período prolongado. Malan insinuou que os juros poderão cair em junho e julho. Mas se sabe que nem as privatizações nem o ajuste fiscal avançarão em apenas dois meses.
Além desses desencontros na fala do ministro, parece frágil, de modo geral, a argumentação de que as atuais taxas de juros servem para conter a inflação até que se alcance o ajuste fiscal. Afinal, é justamente o custo desses juros a principal ameaça ao equilíbrio orçamentário.
Como mostrou Luís Nassif, só os títulos federais consomem o equivalente a uma Vale do Rio Doce em cerca de cinco meses. Se se esperasse o final das privatizações para baixar os juros, o Estado poderia terminar o ``ajuste" mais endividado do que quando começou.
Outra razão para a manutenção de juros altos era reverter a fuga de capitais. Também sob esse aspecto, parece já haver espaço para reduzir as taxas financeiras. Após quatro meses de déficits, o país já acumula este mês um saldo positivo de US$ 1,392 bilhão no fluxo de divisas.
A queda nas compras e no emprego indicam que também na contenção do consumo os juros altos alcançaram seus objetivos. Assim, tudo indica que este é o momento para uma redução consistente dos juros que asfixiam o país e comprometem as contas públicas.

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