São Paulo, quinta-feira, 25 de maio de 1995
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Quem sobreviver, verá

A estabilização econômica inaugurada com o Plano Real propiciou ao país quase dez meses de esperança e entusiasmo. A festa, entretanto, acabou. O divórcio entre a percepção dos empresários e as convicções da equipe econômica parece crescer a cada dia.
Para os economistas do governo, chegou a hora de apertar os cintos e enfrentar a parte difícil do ajuste. Julgam-se capazes de calibrar o mecanismo econômico com precisão suficiente para evitar que o desaquecimento, saudável do ponto de vista da lógica antiinflacionária, converta-se em recessão selvagem.
Entre os empresários parece não estar em questão a justeza e o ``background" acadêmico das autoridades. Mas, se os princípios parecem dignos de elogio (acabar com a inflação, privatizar, equilibrar as contas públicas), a operacionalização deixa muito a desejar.
O episódio de descontrole cambial de março custou muito caro ao país, inicialmente em termos de perda de reservas e, depois, de elevação dos juros reais para consertar o estrago no caixa em divisas fortes no BC. E o esperado esforço de racionalização tributária e reforma do Estado acabou dando lugar a propostas novamente temporárias, como a reedição de um IPMF ou do Fundo Social de Emergência.
Além da falta de tino para a realidade prática que hoje exacerba o ressentimento do empresariado, falta ao país uma visão ordenada e convincente do rumo que se deseja seguir. Ou seja, de um lado, há o ônus do ajuste ainda discutível rumo à estabilidade com escala na recessão e no desemprego. Mas, de outro, o governo nada faz para sinalizar um modelo de desenvolvimento. Tal modelo teria de ser capaz não apenas de confortar a sociedade, mas também de desenhar um horizonte de longo prazo para o aumento dos investimentos.
Pelo andar da carruagem, o governo parece apenas pedir sangue, suor e lágrimas em nome da bonança futura. Mas tem sido ambíguo, para dizer o menos, em termos de asseverar que nesse futuro haverá sobreviventes.

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