São Paulo, sexta-feira, 26 de maio de 1995
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Excesso ou irresponsabilidade?

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA - Em conversa ontem com esta coluna, o presidente do Banco Central, Pérsio Arida, disse que não é sádico nem cultiva satisfação mórbida diante das críticas.
Comentou que gostaria de baixar os juros; as empresas cresceriam, gerando empregos e salários, o que lhe renderia aplausos. Mas estaria, segundo ele, cometendo uma irresponsabilidade. Irresponsabilidade porque jogaria o país na inflação, e, no ano seguinte, viria uma recessão profunda.
Afirmou compreender a chiadeira dos empresários, reconhecendo que os juros estão mesmo muito altos. O governo já estaria percebendo alguns sinais de desaquecimento -daí a sinalização, segundo ele, de redução paulatina da taxa de juros.
Pérsio apenas cumpre orientação do presidente Fernando Henrique Cardoso, baseada num cálculo. Estabilidade mesmo só virá com as reformas constitucionais. Mas as reformas só conseguem ser aprovadas por um governo forte, com apoio popular. Dificilmente, o governo seria forte com inflação em alta, criando-se um círculo vicioso.
Um círculo do qual segmentos empresariais são eternos beneficiários, massacrando os trabalhadores. Curioso que, diante do arrocho salarial, os empresários e seus consultores não se lembrem de alardear como é terrível a crise social.
Aviso ao leitor: devemos ter cuidado tanto com eventuais desastres oficiais -e daí merece reflexão até que ponto o governo não exagera na dose dos juros que produzem desemprego.
Certo que os empresários têm um largo histórico de chiadeira desproporcional, poucos têm compromisso cívico, mas são termômetro -goste-se ou não, estão com as mãos na realidade.
Mas também devemos ter cuidado com os lobbies, fora e dentro do Congresso, que tentam transformar ponderadas reivindicações em histeria.
No final, os mais vulneráveis pagam o preços dos erros de governo e da histeria empresarial. Um dos problemas do Brasil é que pobre é o único grupo que não tem lobby.
PS - Ao mandar o Exército invadir as refinarias, Fernando Henrique Cardoso cometeu, além de excesso desnecessário, um ato de profunda incoerência. Quando era constituinte, ele se esforçou, sem êxito, em limitar os poderes das Forças Armadas. Pela sua proposta, não poderiam, por exemplo, fazer o que fizeram nas refinarias.

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