São Paulo, sexta-feira, 26 de maio de 1995
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Da arte de cavalgar toda uma sela

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - Antes que estranhem o título: é um dos clássicos da língua, já tentei lê-lo por curiosidade e necessidade de melhorar o estilo -que só piorou. Como se deduz, o autor, que era trovador, rei e prosador (não necessariamente um rei prosa como certos mandatários que conhecemos), procura ensinar não apenas a arte de cavalgar (que no português clássico era ``caualgar"), mas artes afins que faziam sucesso ao tempo dele.
Vou tentar lê-lo mais uma vez, motivado pela greve dos petroleiros e pela ocupação militar das refinarias. Ora, direis, que que tem aquilo com aquilo outro? E eu vos direi: tem muito.
Petróleo e sangue sempre deram péssima mistura, apesar disso, volta e meia se encontram. Para evitar o pior, o ideal seria um retorno ao tempo em que as demandas terminavam no duelo pessoal entre os chefes dos povos ou facções em conflito. Existem filmes americanos em que o Império Romano é decidido num duelo de lanças entre o filho de Marco Aurelio (Cômodo) e um centurião desgarrado.
Por ocasião da Guerra das Malvinas, vi uma foto que me impressionou: o escritor Jorge Luis Borges, de bengala, cego, caquético, e o editor inglês McMillan, também de bengala, caindo pelas tabelas. A situação entre Argentina e Inglaterra estava tensa, se houvesse o combate final haveria milhares de mortos.
Num texto que escrevi na ocasião, sugeri que botassem frente a frente Borges e McMillan, com respectivas bengalas, sob arbitragem do papa ou de outra autoridade moral aceita pelos dois lados. Quem vencesse o duelo de bengalas teria razão. Isso evitaria os milhares de mortos.
Reponho a questão: em vez de corrermos os ricos de mortos ou de explosão dos tanques de petróleo, um duelo pessoal entre FHC e Vicentinho, dentro de regras civilizadas, poderia acabar a questão. O tipo de duelo não seria necessariamente cruento, podia ser um campeonato de cuspe a distância, ou, mais civilizado ainda, quem saberia escalar o time do Bonsucesso de 1933, quando foi inaugurado o profissionalismo no futebol.

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