São Paulo, domingo, 28 de maio de 1995
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NA PONTA DO LÁPIS

MARCELO LEITE

Um funcionário público municipal de São Paulo, que preferiu não se identificar, escreveu ao ombudsman para se queixar dos números de uma reportagem sobre o Projeto Cingapura. No último dia 15, ele leu na pág. 3-2 da Folha que favelas de várias regiões da cidade dariam lugar a 28.132 apartamentos, o que iria beneficiar 521 mil pessoas.
"Se dividirmos essas supostas 521 mil pessoas pelos 28.132 apartamentos, teremos uma média incrível de 18,52 pessoas por apartamento. Nada mal para um imóvel de 42 metros quadrados, escreveu, bem-humorado.
São contas simples assim que jornalistas deixam de fazer todos os dias. Não é preciso ser sumidade em matemática para empreendê-las. Basta bom senso e uma calculadora, que se compra hoje por um par de reais.
O funcionário foi adiante e implicou também com a afirmação do secretário municipal de Habitação, Lair Krahenbuhl, de que essas unidades seriam construídas em 72 meses. Ele lembra que a administração Maluf só tem mais 19 meses pela frente e pergunta:
"Não seria lógico que o repórter que ouve uma declaração dessas solicite esclarecimentos? Afinal, um repórter da Folha não ganha seu salário para ser relações-públicas dos políticos, publicando tudo que estes queiram, sem contestação.

Aconteceu de novo. Não só a troca de bilhões por milhões, na Folha, mas também erros de porcentagem. É desanimador.
Na quinta-feira, saiu o erramos vergonhoso: "A dívida do Estado de São Paulo com empreiteiras é de cerca de US$ 3 bilhões, e não de US$ 3 milhões, como afirmava reportagem publicada ontem (quarta) à pág. 1-11.
É o problema das ordens de grandeza. Na casa da dezena de milhões de dólares estão por exemplo alguns imóveis de luxo de São Paulo ou Rio. Estradas, hidrelétricas e obras como o desassoreamento do rio Tietê entram pela faixa de muitas dezenas ou centenas de milhões. Mais de 1 bilhão, só projetos de grande porte, como a rede de radares para a Amazônia (Sivam).
Todo jornalista deveria ter esses termos de comparação em mente. Evitaria muita dor-de-cabeça. E muito carão.
A semana teve também novos tropeços com porcentagens, mas desta vez não foi com decréscimos acima de 100%. Foi erro de conta, mesmo.
Na pág. 3-4 de quinta-feira, o título principal anunciava: "Blitz eleva média de multas por estacionamento em 31%. A comparação se fazia entre a média dos dois primeiros dias da semana (respectivamente, 6.589 e 5.589 multas) e a média diária das duas primeiras semanas (4.701).
A média dos dois dias dá 6.089. Sobre 4.701, um crescimento de 29,5% (e não 31%).

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