São Paulo, domingo, 28 de maio de 1995 |
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Momento é de desequilíbrio econômico, diz João Sayad
FERNANDO RODRIGUES
Ex-ministro do Planejamento (85 a 87), Sayad acha que muitos comerciantes esperavam vender muito mais este ano do que em 94. Como isso não será possível, esses lojistas cortam encomendas que fizeram para a indústria. ``Isso se chama em economia de efeito acelerador ou desacelerador, conforme o caso", afirmou o economista à Folha . Um dos criadores do Plano Cruzado, durante o governo Sarney (85-90), Sayad criticou durante a entrevista a dificuldade de se acompanhar cientificamente as variações do PIB no Brasil, o que impede uma aferição mais precisa do ritmo da economia. ``Não é que não dá para considerar o PIB. Só dá para se considerar os outros índices, porque não há indicador do PIB mensal. Mesmo o PIB trimestral é precário, pois são sempre estimativas preliminares", disse. Sayad, hoje presidente do Banco SRL e professor da Faculdade de Economia e Administração (FEA), da Universidade de São Paulo (USP), falou à Folha na quinta-feira. A seguir, os principais trechos da entrevista: Folha - Para haver recessão, dizem os teóricos, um país tem de apresentar uma redução do PIB durante três meses seguidos. O sr. acha que isso deve ocorrer no Brasil este ano? João Sayad - Esse é um critério que foi feito para os Estados Unidos, que têm informações mensais e trimestrais para o PIB. Aqui nós não temos. Temos um levantamento sobre vendas, outro fajuto sobre emprego... Nós não usamos essa definição, esse critério fino que os americanos têm. Folha - E como se mede recessão no Brasil? Sayad - No Brasil, recessão é crescimento negativo. Ou, o termo mais correto é `decrescimento'. Ou seja, quando o PIB varia negativamente no ano: - 1%, - 2% e assim por diante. Tivemos grandes recessões no Brasil em 81, 83, 90 e 91. Foram quatro mergulhos recessivos. Mas, não faz sentido usar períodos de três meses de redução do PIB para caracterizar uma recessão. Porque você não tem números de três meses e só há estimativas indiretas. Folha - No caso do Brasil, o sr. não acha possível considerar só o PIB para medir recessão? Sayad - Não é que não dá para considerar o PIB. Só dá para se considerar os outros índices, porque não há indicadores do PIB mensal. Mesmo o PIB trimestral é precário, pois são sempre estimativas preliminares. Os economistas brasileiros não usam a convenção americana porque não é consistente com a nossa base de dados. Folha - O sr. acha que deveria haver um acompanhamento mais consistente da economia brasileira, com mais índices e mais regularidade na divulgação do PIB, como se faz nos EUA? Sayad - Acho que sim. Tanto que essas dúvidas sobre como estaria evoluindo o PIB decorrem da falta de um indicador confiável. Folha - Quais os índices o sr. considera para analisar o estado da economia no Brasil? Sayad - É complicado. Há o INA (Índice Nacional de Atividades), da Fiesp. Mas há críticas a ele por não incluir alguns dados. Tem também as estatísticas de emprego, que a Fiesp divulga semanalmente. O problema aí é que trata-se apenas do nível de emprego e não o de produção. Outro indicador importante é o nível de vendas no comércio. Nesse caso, eu faço uma divisão: vendas de produtos duráveis e não-duráveis. As vendas de produtos duráveis estão associadas tanto ao nível de atividade como às taxas de juros: porque você pode comprar um carro ou geladeira hoje ou daqui a cinco anos. Folha - Agora, as suas previsões para a economia. Depois de ter crescido cerca de 10% no primeiro trimestre, o país toma que rumo daqui para frente? Sayad - A tendência é de redução da taxa de crescimento. Mas, não de `decrescimento'. Eu não acredito que o país venha a ter recessão no ano. No curto prazo, pode acontecer o seguinte: suponha que o comércio tenha estimado vender, em junho, 10% a mais do que em junho do ano passado. Mas suponha que isso não ocorra e que o comércio simplesmente venda em junho o mesmo que vendeu no mesmo mês de 94... Folha - ...Ou seja, não há recessão? Sayad - Exato. Não há recessão. Mas isso pode gerar, no curto prazo, alguma oscilação negativa no PIB do país, portanto recessão. Isso ocorre porque se o comércio estava prevendo crescer 10%, precisaria fazer encomendas de 10% a mais para vender e 10% a mais para fazer estoque. Folha - O sr. poderia dar um exemplo prático? Sayad - Por exemplo alguém que venda 10 kg de presunto por mês. Além do que vende, essa pessoa mantém outros 5kg de presunto de estoque. Pois bem, como havia a previsão de vender 10% a mais em junho, o comerciante já havia encomendado 1kg a mais para venda e 1kg a mais para seu estoque. Só que, agora, percebeu que não vai vender tanto presunto em junho como esperava. O que acontece? Como não vai vender, ele corta imediatamente a encomenda extra de presunto para vendas e estoque. Esse tipo de reação é ruim para a indústria no curto prazo. É isso que está acontecendo na economia agora. Folha - Isso daria uma sensação de haver uma recessão quando só ocorre um ajuste? Sayad - Neste período atual há uma redução maior do nível de atividade que você terá ao longo de todo o ano. Isso se chama em economia de efeito acelerador ou desacelerador, conforme o caso. Isso gera um desequilíbrio entre as vendas do comércio e as encomendas para a indústria. Folha - Ou seja, o sr. está convencido de que não haverá queda no PIB este ano? Sayad - É muito cedo para dizer, mas é isso que ouço dos meus clientes e de outras pessoas. Folha - O governo espera que o crescimento da economia não exceda 3% ou 4% este ano. O sr. considera exequível essa meta? Sayad - Bom, já cresceu 10% nos três primeiros meses. Para que a taxa do ano ficasse entre 3% e 4%, nos meses restantes o crescimento teria de ser de menos de 1% ao mês. Acho que a situação será um pouco ruim, mas acho possível que isso ocorra. Texto Anterior: Governo quer limitar crescimento a 5% Próximo Texto: A volta do príncipe Índice |
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