São Paulo, domingo, 28 de maio de 1995
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A atração fatal aos juros...

ÁLVARO ANTÔNIO ZINI JR.

``Chi, tá PhDando tudo errado..."
Do filósofo da racionalidade governamental brasileira, José Simão, na Folha, 26 de maio

Louca é a realidade brasileira ou loucos ficam os economistas quando chegam ao governo? Quem sabe? Mas, a julgar pela ``sabedoria" dos argumentos ouvidos na semana passada em defesa da política de juros de agiota do governo, ouvimos coisas mais engraçadas e desmioladas do que qualquer programa da Regina Casé.
Quem leu os jornais brasileiros da semana passada com certeza esteve próximo de sofrer um ``choque de irrealidade" se tentou descobrir alguma linha lógica nas declarações das autoridades responsáveis pela política econômica brasileira a respeito da taxa de juros.
Os raciocínios expostos, em entrevistas sucessivas, pelo ministro da Fazenda, presidente do Banco Central, presidente do BNDES e adjuntos mostraram homogeneidade digna dos recrutas do Exército de Brancaleone. Foi tiro, grito e praga para todos os lados. Lógica, mesmo, nada!
Mas ainda pior ficou quando alguns ``aliados" acharam que era hora de vir apoio à política indefensável. Veio Lara Resende na terça-feira e não disse nada além de leves platitudes. (E quem é o tal do colunista-conferencista que ficou rico por fazer ilações sobre ex-membros da equipe econômica que ficaram ricos?) Veio Gilberto Dimenstein, da sucursal da Folha em Brasília e produziu um choramingo de apoio à equipe econômica (será que ele sabe de algum complô?).
Se fôssemos medir as chances de desenvolvimento econômico do Brasil como sendo proporcionais à lógica apresentada por estas autoridades, deveríamos ficar preocupados.
Para não deixar os leitores com a impressão de que não existe esperança, vamos ressaltar alguns pontos básicos.
Faz parte da lógica (lógica da sobrevivência) que quando vários percebem um perigo iminente, devem procurar mostrar que aquela rota conduz a um desastre.
Faz parte da lógica (lógica lentamente apreendida por estes primatas melhorados que somos nós) que quando se vê que a ação irresponsável de dois ou três pode trazer prejuízo para muitos, deve-se gritar. Em Direito, o pessoal chama isto de ``jus sperniandis".
Faz parte do conhecimento econômico que desenvolvimento se faz com aumento da produção e não com ciranda financeira para forçar a privatização.
Quem alerta, como Luís Nassif, que cinco meses de juros aos níveis atuais equivalem a uma Vale; quem relembra, como o cada vez mais lúcido deputado Delfim Netto, que esta política de juros altos é um subterfúgio do governo para financiar o erro causado por ter deixado a taxa de câmbio ficar apreciada; e quem faz uma edição histórica, como a da Folha do último domingo, mostrando com números e quadros o impasse em formação, está agindo responsavelmente.
Mesmo este seu escriba, que em sua última coluna fez alguns cálculos com base em dados retirados de publicações oficiais e mostrou que a política de juros faz com que o governo federal esteja com um déficit nominal de 12% do PIB, que a privatização não vai dar para pagar a tal da ``dívida", que São Paulo está sem dinheiro até para pagar os juros que vencem a cada mês; mesmo este seu escriba espera estar dando uma contribuição ao país.
Mas, talvez não àquele país onde a concentração de renda está virando uma profissão, cujo roteiro começa por tornar-se diretor do Banco Central e cuja fase subsequente é virar diretor/acionista/sócio de banco.
Dá para acreditar que este pessoal vai construir um país?

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