São Paulo, domingo, 28 de maio de 1995
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Castelo de cartas

MARCOS CINTRA

É comum se acreditar na existência de grande distância entre teoria e prática e, portanto, se negar a validade das formulações teóricas.
Por outro lado, é fácil mostrar que não existe nada mais prático do que uma boa teoria. Um bom modelo ajuda a organizar o pensamento e leva a conclusões indicativas da realidade com rapidez e eficiência.
Vale notar, contudo, que teoria é a simples aplicação do raciocínio lógico a um conjunto de premissas. Assim, se as premissas são falsas, também as conclusões o serão.
O campo tributário é um excelente laboratório para demonstrar esta dicotomia.
Os modelos tributários derivados dos conceitos tradicionais em finanças públicas partem de pressupostos altamente questionáveis: existência de mercados competitivos perfeitos, ausência de custos de transação e inexistência de evasão.
Algumas recomendações resultantes destes modelos são amplamente conhecidas, a ponto de se tornarem axiomáticas, ainda que possam ser falsas: a superioridade dos impostos diretos sobre os indiretos e dos impostos sobre valor agregado relativamente aos cumulativos.
Recentemente, a contribuição de economistas institucionalistas vem sendo reconhecida pela profissão e oferece elementos para que se comece a questionar as conclusões convencionais.
Ronald Coase, James Buchanan e Douglas North, todos agraciados recentemente com prêmios Nobel, buscam demonstrar que as instituições e o ambiente cultural de cada sociedade podem alterar radicalmente conclusões que até então vinham sendo aceitas sem restrições.
No campo tributário, esta dicotomia torna-se evidente. Modelos sofisticados de tributação ótima recomendam a adoção de tributos que a prática vem condenando de forma inapelável.
Apesar da sofisticação utilizada para justificar a maior eficiência dos impostos convencionais, como o Imposto de Renda e os impostos sobre valor adicionado, a realidade nos mostra que se gerou no Brasil uma economia marcada pela sonegação, pela corrupção fiscal, pela iniquidade e pelos altos custos de transação e de arrecadação.
É hora de atentarmos para o que nos dizem estes economistas ecléticos. É preciso ajustar os modelos à realidade. Infelizmente, o conhecimento tributário convencional busca o inverso: amoldar a realidade aos ditames da utopia.

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