São Paulo, segunda-feira, 29 de maio de 1995
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Recessão já faz parte do vocabulário

CLÓVIS ROSSI
DA REPORTAGEM LOCAL

Há outro efeito perverso das taxas de juros altas: a palavra recessão já entrou no vocabulário do empresariado.
``Há, de fato, setores aquecidos, como automóveis e componentes, mas há também setores, como a construção civil, absolutamente estagnados", depõe Jorge Gerdau.
O empresário diz que a diferença de situações não é apenas setorial, mas também regional. ``O Nordeste está um caos", afirma.
Pelas contas do grupo, cerca de 40% dos créditos a receber no Nordeste não estão sendo pagos. A média histórica de inadimplência na região não passa de 8% e 12%.
Mais ao sul, na riquíssima Uberlândia (MG), a Martins, empresa de US$ 1,4 bilhão de faturamento, queixa-se de uma inadimplência de 50%.
``Estou vendo que começa a ficar abalada a expectativa em relação à economia, o que é às vezes mais importante do que os fatos", depõe Stefan Bodgan Salej, presidente da Fiemg (Federação das Indústrias de Minas Gerais).
``Estamos em dúvida sobre se o governo deseja ou não uma recessão", confirma em São Paulo Boris Tabacof, da Fiesp.
É por isso que setores importantes do empresariado criticam o que consideram excesso de academicismo da equipe econômica.
Tabacof chega a ironizar: ``A equipe chegou à parte do manual que diz que as empresas têm que quebrar e o país entrar em recessão."
Sérgio Magalhães, presidente da Abimaq, de seu lado, reclama que ``a equipe é acadêmica demais. Só se guia pelos livros, não fala com os industriais".
Stefan Bodgan (Fiemg) vai mais longe. Critica o que considera ``exagerado monetarismo", acoplado a uma abertura da economia, sem uma lei antidumping como a Argentina, e a ``falta de uma política clara de aumento da produção nacional".
``Está se administrando exageradamente a demanda, sem pensar na oferta", resume o líder dos industriais mineiros.
Mais condescendente, Gerdau admite que ``o processo de condução operacional da política econômica é extremamente delicado".
Mas, assim mesmo, reforça a crítica sobre a dificuldade de ``se detectar de Brasília a complexidade da situação".
Complexidade tamanha que alguns industriais chegam a imaginar que mesmo uma redução abrupta dos juros não levaria a uma disparada dos preços, ainda que o consumo aumentasse.
Diz, por exemplo, Boris Tabacof: ``Não é pelos juros altos que os preços não estão subindo. É pela estabilidade dos preços agrícolas e dos preços que o governo controla", em alusão às tarifas dos serviços públicos congeladas há 10 meses.
Henrique Meirelles, do lado dos banqueiros, tende a concordar: ``Juro alto reprime pouco o financiamento do consumo, que no Brasil não é substancial, ao contrário dos Estados Unidos."
O presidente do Banco de Boston prefere acreditar que os juros altos são menos para conter o consumo e mais para equilibrar o balanço de pagamentos (total das contas externas do país).
Com isso, o país pode ter déficit (ou saldo pequeno) na balança comercial (exportações menos importações) porque compensa no balanço de capitais.
O problema é que esses capitais, geralmente especulativos, não produzem riquezas.
``Se persistir o juro alto e vier um pouco de recessão, a fábrica pode não fechar, mas o fabricante vira revendedor, o que reduz o emprego", resume Sérgio Magalhães, da Abimaq. (Clóvis Rossi).

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