São Paulo, quinta-feira, 8 de junho de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Entre a vida e o óleo

Estranho mundo este que se prepara para mudar de século. A vida humana parece ter, cada vez mais, cotação inferior à dos bens materiais. O exemplo mais emblemático dessa situação é a crise na antiga Iugoslávia, tornada mais dramática pelo caso dos reféns tomados pelos sérvios, entre eles dois oficiais brasileiros, um já libertado.
Faz três anos que os países resultantes do estilhaçamento da Iugoslávia sangram em uma guerra sem fim. As potências militares do planeta e as organizações internacionais não conseguem pôr fim à sangria, por inapetência, incompetência ou por desacordos entre elas.
O contraste é chocante, se se compara com a reação internacional à ocupação do Kuait pelo Iraque. Numa situação parecida com a da Bósnia de hoje, as Nações Unidas, sob comando dos Estados Unidos, armaram rapidamente uma operação de guerra para forçar o Iraque a abandonar o emirado. Entre a ocupação, em agosto de 1990, e a invasão das tropas aliadas, em janeiro de 1991, passaram-se apenas cinco meses.
Na Bósnia, os três anos de ocupação pelos sérvios e da chamada ``limpeza étnica", a perseguição aos muçulmanos que eram maioria na Bósnia, não foram suficientes para mobilizar da mesma forma a comunidade das nações.
Não parece despropositado dizer que a razão para comportamento tão díspar está no fato de que o Kuait é importante produtor de petróleo e a Bósnia não.
Certamente por isso, puseram-se em jogo incontáveis vidas humanas na operação de desocupação do Kuait. Já na Bósnia, a Otan limita-se a ataques aéreos, menos arriscados para os atacantes, contra posições sérvias, que se revelam ineficazes.
É como se vidas humanas só valessem algo se por baixo delas houver petróleo.

Texto Anterior: Promiscuidade
Próximo Texto: A armadilha
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.