São Paulo, quinta-feira, 8 de junho de 1995
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A armadilha

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Antes de assumir o Ministério do Planejamento, José Serra tinha uma avaliação que se vai revelando mais e mais correta: a crise mexicana colocara o Brasil na armadilha do câmbio.
Motivo: o Brasil não poderia manter por muito tempo o real sobrevalorizado, sob pena de registrar contínuos déficits comerciais. Como o país tem um déficit estrutural na conta de serviços (juros da dívida externa, royalties, fretes, seguros etc.), a soma de déficit nas trocas de mercadorias com déficit nos serviços seria mortal.
Mas também não poderia mexer muito no câmbio, sob pena de realimentar a inflação. Mesmo os preços que não têm qualquer vínculo com o exterior (o encanador da esquina, o médico etc.) pautam-se pelo dólar. Um dólar mais caro significaria preços internos também mais altos.
Seis meses depois da posse do novo governo, a armadilha que Serra enxergava então cobra um preço cada vez mais alto.
A importação de automóveis atrapalha a balança comercial? Aumente-se a tarifa de importação de 32% para 70%. Nem assim o problema se resolve? Estabeleçam-se cotas de importação. Porque não se pode mexer no câmbio.
Na ponta dos juros, é a mesma coisa. Primeiro, o governo alegou que eles baixariam tão logo a economia se desaquecesse e as reformas avançassem. A economia já se desaqueceu (os supermercados, por exemplo, venderam 10% menos no mês passado). As reformas já avançaram (não parece haver dúvidas de que as mudanças na Ordem Econômica da Constituição serão todas aprovadas).
Agora, o governo alega que é preciso esperar a desindexação para poder baixar os juros. O problema não é esse. O problema é que, para fechar as contas externas, com déficit na conta de serviços e saldo magro (ou nenhum) na conta comercial, só mesmo com o ingresso de capitais em grande volume. Para isso, o Brasil precisa oferecer juros 15 vezes superiores aos do mundo civilizado.
A alternativa é deixar que as reservas escorram pelo ralo. Essa continua sendo a armadilha. O resto é desculpa.

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