São Paulo, domingo, 11 de junho de 1995
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Amor paira acima de tudo na tela

SERGIO AUGUSTO
DA SUCURSAL DO RIO

Em homenagem antecipada ao Dia dos Namorados, vários casais, vestidos a caráter, andaram reproduzindo em ruas e praças do Rio o beijo final do filme ``Cinema Paradiso". Poderiam ter recriado a cena do balcão de ``Romeu e Julieta" ou lido alguns clássicos da poesia romântica, mas preferiram um momento cinematográfico. Assim o fizeram não só por causa dos cem anos do cinema, mas sobretudo porque na tela, nosso branco quadro-negro afetivo, o amor costuma pairar acima de todas as coisas.
Até sobre a morte ele paira, conforme se viu no primeiro clássico de Fritz Lang (``Pode o Amor Mais que a Morte"), nas órficas fantasias de Jean Cocteau, e em filmes mais populares, como ``Amor Sem Fim" (Peter Ibbetson), ``O Fantasma Apaixonado" (The Ghost and Mr. Muir) e, mais recentemente, em ``Em Algum Lugar do Passado" (Somewhere in Time) e ``Ghost".
No primeiro, Gary Cooper e Ann Harding acabavam premiados, literalmente, com o amor eterno. No segundo, Gene Tierney se deixava seduzir pelo espírito de um velho capitão do mar, encarnado por Rex Harrison.
Os dois últimos filmes, ainda frescos na memória de todos, dispensam detalhes.
Num dia como o de amanhã, outros filmes, mais representativos do que ``Cinema Paradiso", mereciam ser lembrados. Todos aqueles providos de inesquecíveis epifanias sentimentais, por exemplo. Paul Henreid acendendo dois cigarros em ``Estranha Passageira" (Now Voyager): um para ele, outro para Bette Davis. Ingrid Bergman perguntando a Humphrey Bogart se o barulho que ela está ouvindo é o seu coração batendo ou o tiro de algum canhão (claro que foi em ``Casablanca"). Jennifer Jones e William Holden arrulhando numa colina de Hong Kong em ``Suplício de uma Saudade" (Love is a Many Splendored Thing). O encontro final de Cary Grant e Deborah Kerr em ``Tarde Demais Para Esquecer" (An Affair to Remember).
Apenas dois dos quatros ``affairs" citados tiveram um final feliz. A rigor, no Dia dos Namorados só os casos de amor com ``happy end" deveriam ser celebrados. No entanto, namoros turbulentos, aparentemente inviáveis e sem futuro, mas com um desfecho redentor, como o de John Wayne e Maureen O'Hara em ``Depois do Vendaval" (The Quiet Man) e o de Janes Stewart e Margaret Sullavan em ``A Loja da Esquina" (The Shop Around the Corner), destilam um encanto que outros, percorrendo o caminho inverso, não possuem. Esses, sim, e não melodramas como ``A Ponte de Waterloo" e ``Desencanto", representam à perfeição a efeméride de hoje.
Sedução com flores, jóias, serestas, objetos decorativos, roupas, casas, viagens de luxo, e até animais, também virou recurso corriqueiro no cinema. Já um teatro é presente que transcende as normas usuais da conquista amorosa. Pois foi justamente isso que Charles Foster Kane deu à sua amada Susan Alexander, na obra-prima de Orson Welles. E nem era Dia dos Namorados.
Como não existe namoro sem cantada e declarações de amor, que tal evocarmos pelo menos duas? Uma inoportuna, outra mais que oportuna. Em ``Jornadas Heróicas" (The Plainsman), Jean Arthur exigia que Gary Cooper dissesse que a amava, justo quando uma horda de peles-vermelhas se preparava para escalpelá-lo. Em ``Corpos Ardentes" (Body Heat), William Hurt tira uma chinfra de Kathleen Turner e comenta: ``Talvez você não devesse usar um vestido como este". Ela: ``Isto é uma saia e blusa. Não sei do que você está falando". Ele: ``Você não devia era usar este corpo".

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