São Paulo, domingo, 11 de junho de 1995
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A desindexação necessária

ÁLVARO ANTÔNIO ZINI JR.

O noticiário desta semana trouxe várias manifestações de intenção do governo de iniciar um processo de desindexação de ativos financeiros, pois esta indexação colabora para manter juros altos e para a repetição de taxas inflacionárias elevadas.
O presidente Fernando Henrique Cardoso, segundo a Folha do último dia 9, disse que a partir de julho o governo terá "uma nova avenida a percorrer no sentido da desindexação e da redução da dívida interna, acrescentando ainda que vai enfrentar a ciranda financeira "com competência técnica e não com explosão emocional.
Como alguém que desde meados dos anos 80 vem defendendo estes pontos de vista e apresentando algumas sugestões sobre como fazer a desindexação da moeda, só posso manifestar minha concordância.
Mas para tornar esta discussão mais técnica é preciso entender porque alguns de nós, economistas, insistem que a invenção da moeda indexada no Brasil foi um mal para o país.
Todo o pensamento moderno sobre os processos de inflação elevada sublinha que estes processos devem-se à perda de controle da emissão de moeda. Forma-se um círculo vicioso em que um governo precisa fechar suas contas emitindo moeda (o que equivale a cobrar um tipo de imposto chamado de "senhoriagem), mas a população de um modo geral não deseja reter aquela moeda, pois ela perde valor dia-a-dia.
Assim, para coletar algo em torno de 2% do PIB nos últimos 15 anos com o imposto da senhoriagem (valor médio deste imposto de 1980 a 1994), mas sob uma base muito pequena de estoque de moeda, o governo levou o país a taxas de inflação cavalares.
No caso do Brasil inventou-se, então, um substituto próximo da moeda, que são as contas de curto prazo que rendem juros. Basicamente para pagar estes juros os bancos compram títulos da dívida pública de curto prazo e com os juros destes títulos pagam aos depositantes nas contas do tipo FAF e assemelhadas.
A desindexação fundamental que necessita ser realizada, ao lado da dos salários, é a deste sistema de contas de curto prazo (moeda indexada), de modo a permitir que também a dívida interna do governo possa ser vendida a prazos mais longos e a juros menores.
Estes dois objetivos são realizáveis. O último exemplar da "Revista da Economia Política (volume de abril de 1995), contém dois ou três estudos que se aplicam ao tema.
Em um competente artigo, Fábio Giambiagi mostra que a troca da dívida pública de curto prazo por títulos de sete anos, com taxa de juros em dólar de 12% ao ano, permitiria seu barateamento ao Tesouro. Basicamente, a dívida interna poderia ser paga exigindo um superávit primário do Tesouro entre 2% a 2,5% do PIB, o que é factível.
No mesmo exemplar da revista há o estudo que Jeffrey Sachs e eu fizemos antes do Real e nossas sugestões de como é possível começar uma fase de transição para a extinção das contas indexadas sem envolver bloqueio dos depósitos. Requer-se mais do que tudo uma decisão política do governo para enfrentar os interesses lobistas que lucram com a manutenção da sistemática atual.
O fulcro das sugestões do artigo é no sentido de aumentar a participação da base monetária dentre os ativos financeiros da economia, pois se ficar a situação atual de baixa relação base monetária/PIB o pais fica vulnerável à volta da inflação alta. Um pequeno déficit público que seja, se financiado com a emissão de moeda, conduz à volta da espiral inflacionária.
Este é o dilema do país: manter a moeda indexada e ficar preso à possibilidade de que pequenos erros de política façam ressurgir a inflação ou desindexar as contas de curto prazo e voltar para um sistema monetário mais tradicional, mas que confere maior eficácia para a política monetária no combate à inflação.

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