São Paulo, domingo, 11 de junho de 1995
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Para Vargas Llosa, Sérvia busca a paz

ANDRÉ FONTENELLE
ENVIADO ESPECIAL A BELGRADO

O escritor peruano Mario Vargas Llosa disse à Folha que o presidente da Sérvia, Slobodan Milosevic, se converteu ao pacifismo para garantir seu futuro político.
"Ele adotou uma estratégia que lhe permite a sobrevivência. Menos mal porque isso cria uma margem para a negociação do conflito", afirmou.
Vargas Llosa passou três dias em Belgrado para promover, em nome da organização de defesa da liberdade de expressão "Article 19", um livro que denuncia a manipulação dos meios de comunicação na ex-Iugoslávia.
"A Fabricação da Guerra", do inglês Mark Thompson, acusa autoridades da Bósnia, da Sérvia e da Croácia de terem usado a imprensa para insuflar o ódio entre as diferentes etnias que compunham a Iugoslávia até 1991.
Vargas Llosa não teme que sua visita seja vista como uma tentativa de legitimar o regime de Milosevic, boicotado pela comunidade internacional.
"Não vim criticar o governo, mas divulgar todos os atropelos dos meios de comunicação, inclusive aqueles pelos quais o próprio Milosevic é responsável."
Milosevic apoiou os separatistas sérvios na Bósnia e na Croácia no início do conflito, em 1992. Hoje se apresenta como um intermediário para a paz na região -negociando, por exemplo, a libertação dos soldados e observadores da ONU mantidos como reféns pelos sérvios bósnios.
O escritor peruano está pessimista em relação a uma saída negociada para o conflito. Ele criticou o papel das grandes potências, como a Alemanha, cujo reconhecimento precoce da Croácia e da Eslovênia, em 1991, é considerado um dos estopins da guerra.
"Uma das coisas mais graves, na minha opinião, é que há uma espécie de cansaço da comunidade internacional", disse.
Durante uma palestra no centro cultural britânico de Belgrado, Vargas Llosa comparou o conflito na Bósnia com a guerra entre Peru e Equador, em fevereiro deste ano.
"A imprensa também teve um papel trágico nessa guerra. Os dois países passaram décadas lutando por uma selva com comunidades índias que não sabem nem sequer onde termina o Peru."
Ele reconheceu que, muitas vezes, grandes escritores também "defenderam o ódio e a intolerância". "Aragon, Eluard e Neruda dedicaram odes a Stálin. É uma vergonha. Também se escreveu para Fidel Castro, outro assassino. Borges, o maior escritor da América Latina, foi condecorado por Pinochet", afirmou.
Respondendo a uma pergunta da imprensa local, Vargas Llosa disse que não vai mais se candidatar à Presidência do Peru (perdeu em sua única tentativa de 1991 para Alberto Fujimori, que se reelegeu este ano).

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