São Paulo, sexta-feira, 16 de junho de 1995
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Tempos modernos

Uma das mais importantes decisões que o governo terá de tomar em breve refere-se ao futuro da política salarial depois do primeiro ano do real. As diversas regras adotadas ao longo de anos e anos de inflação elevada baseavam-se sempre em algum tipo de indexação. Assim, ofereciam alguma proteção contra desgastes mais drásticos -embora fossem incapazes de deter a corrosão progressiva do poder de compra-, mas sempre ao custo de engessar a própria inflação.
Nesse sentido, a meta geral defendida pelo governo, de desindexar os salários e permitir que sejam definidos em livre negociação entre trabalhadores e empresários, é acertada e deve ser perseguida.
Mas, se essa deve ser a regra geral, há alguns aspectos que merecem atenção especial, como por exemplo o salário mínimo. Essa remuneração tem uma justificativa extra-econômica, que é o direito individual de cada trabalhador pelo menos à sobrevivência minimamente digna. Esse objetivo evidentemente não tem sido atendido de forma adequada (o valor do mínimo no Brasil é sabidamente vergonhoso), mas a situação decerto seria pior sem um piso legal dotado de mecanismos contra depreciação. É acertada portanto a posição do governo, revelada por esta Folha, de manter o mínimo protegido.
Outro ponto que merece consideração diz respeito à igualdade de tratamento na transição para o real. A sistemática adotada até aqui, de garantir o reajuste do IPC-r acumulado só até a data-base, gera distorções entre as categorias. Assim, seria mais justo garantir a reposição de toda a inflação acumulada até junho. Todos teriam assim o mesmo ponto de partida, a partir do qual vigoraria a livre negociação.
Se quer realmente melhorar a situação do mercado de trabalho, porém, o governo terá de se dedicar à revisão da atual legislação sobre o tema. A pletora de encargos incidentes sobre salários, por exemplo, visa a proteger o trabalhador, mas acaba tendo efeito oposto, já que desestimula a contratação e incentiva a informalidade.
Com a livre negociação e uma legislação mais racional, o país daria um salto importantíssimo para adaptar-se à nova conjuntura interna e internacional modernizando suas relações de trabalho.

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