São Paulo, quarta-feira, 21 de junho de 1995
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Primeira semana foi a mais difícil, diz brasileiro

ROGÉRIO SIMÕES
ENVIADO ESPECIAL A ZAGREB

O período mais difícil dos 23 dias do capitão brasileiro Harley Alves nas mãos dos sérvios da Bósnia foi a primeira semana.
Alves, 36, passou os primeiros seis dias algemado.
Em entrevista ontem à Folha, na base da ONU em Zagreb (Croácia), Harley Alves, cujo nome vem da paixão de seu pai pela moto Harley Davidson, afirmou que sempre acreditou que sua prisão terminaria bem.

Folha - O sr. imaginava que poderia passar por tal situação?
Harley Alves - Claro, quando você está na guerra, tem de estar preparado para qualquer coisa.
Folha - Como foi sua prisão?
Alves - Normal. Como observadores, vivemos numa casa comum. Quando os sérvios chegaram, já esperávamos por isso. Vimos a situação se deteriorando.
Folha - Como era o seu relacionamento com os sérvios?
Alves - Era normal. A missão deles era nos manter sob guarda, e nós estávamos como prisioneiros.
Folha - Que informação o sr. tinha sobre outros reféns?
Alves - No começo fomos proibidos de ter acesso a notícias. Mas, com algumas reivindicações, eles permitiram. Então, pudemos acompanhar as negociações.
Folha - Qual foi o período mais difícil nesses 23 dias?
Alves - Sem dúvida, o período mais difícil foi o início. Houve um nervosismo geral, aquela atitude de colocar todos como escudos humanos. A emoção maior foi quando eu pude falar com a minha família. Liguei duas vezes.
Folha - O sr. ficou algemado?
Alves - No momento da prisão, fomos algemados, mantidos sob guarda. Ficamos um tempo assim.
Folha - O sr. tinha alguma coisa para ocupar seu tempo?
Alves - Nos seis primeiros dias, eu não tinha praticamente nada. Depois de algumas solicitações, eles permitiram que eu voltasse à minha estação para pegar material de higiene, muda de roupa.
Aproveitei para pegar livros, e foi essa leitura que me acompanhou. Um livro de história do Brasil, um sobre relacionamento familiar e uma gramática de inglês.
Folha - O sr. pensa em voltar ao mesmo posto?
Alves - Como profissional, como militar, eu cumpro ordens. E, particularmente, eu posso dizer que eu estou disposto a tentar reaver aquele trabalho. Mas não creio que isso vá acontecer, porque a confiança, o respeito mútuo, foi de certa forma minado.
Folha - O sr. deve receber dez dias de folga. Vai ao Brasil?
Alves - Sem dúvida, essa é minha maior vontade agora.

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