São Paulo, quinta-feira, 22 de junho de 1995
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Ajuste fiscal _ um longo processo

FABIO GIAMBIAGI

O Banco Central divulgou recentemente o resultado fiscal de 1994. A tabela abaixo representa os resultados desagregados desde 1989. Ela mostra que, entre 1989 e 1994, houve no Brasil uma nítida mudança da situação fiscal, caracterizada tanto por uma redução dos juros de 2,8% do PIB como por uma melhora de 4,1% do PIB resultado primário. Mesmo excluindo o ano atípico de 1990, na média de 1991/94 houve um ajuste de 5,8% do PIB em relação ao déficit operacional de 1989.
Muitos leitores devem pensar que esses resultados deveram-se:
(a) a fatores excepcionais, como a redução do valor das aposentadorias e dos gastos de pessoal ou o pagamento de juros negativos sobre os NCZ$;
(b) à redução do fluxo de juros, que não representaria um ``verdadeiro" ajustamento, como o que alguns países realizaram nos anos 80. Tais interpretações, porém, não são satisfatórias.
Comecemos por (a). De fato, fatores excepcionais explicam em parte os resultados de alguns anos, mas não os de 1993/94, quando o pagamento dos benefícios previdenciários e de pessoal foi descomprimido e não havia mais NCZ$ bloqueados.
Nesse sentido, os números de 1993/94 refletem avanços, como o aumento da receita ou o cancelamento de 10% do total de benefícios previdenciários, que implicaram uma redução permanente do déficit público.
É verdade que em 1994 houve uma receita extraordinária (IPMF) de 0,9% do PIB. Levando em conta, porém, que em torno de 30% do imposto estava vinculado a gastos, o incremento líquido de receita associado a ele foi de 70% de 0,9 = 0,6% do PIB.
Isto é, o fim do IPMF converte o equilíbrio de 1994 em um déficit de apenas 0,6% do PIB. Como, além disso, as outras receitas neste ano estão compensando o fim do IPMF, conclui-se que, se o gasto for controlado, o equilíbrio poderá se manter em 1995.
No que tange ao ponto (b), há dois aspectos essenciais para entender as diferenças entre o caso brasileiro e o de outros países. Primeiro, nossa dívida pública é muito inferior à que existia em países como o México ou o Chile quando estes tiveram de diminuir o setor público. E, segundo, apesar do seu aumento recente, a taxa de juros externa ainda é metade do que era nos anos nos quais aqueles países se ajustaram.
O que se quer enfatizar é que o superávit primário que o governo deve gerar para cobrir o fluxo de juros é inferior tanto em relação ao que era necessário ter no passado no Brasil como em relação ao que outros países tiveram de gerar durante os anos 80.
Os dados de 1994 reafirmam, portanto, a tendência de ajustamento e mostram uma realidade menos dramática do que se julgava no debate recente. Nesse sentido, o ajuste fiscal deve ser visto como um processo longo e difícil, no qual os agentes vão se convencendo gradualmente de que os desequilíbrios foram superados.
Com base nessa ótica, as reformas estruturais anunciadas para 1995/96 representam a consolidação desse processo, mais do que uma forma de acabar subitamente com o déficit público, o qual vem sendo combatido com êxito há um quinquênio.
Em resumo, a tabela sugere:
(a) que os Estados e municípios devem cooperar mais para o equilíbrio fiscal, já que, entre 1989 e 1994, a União e as estatais melhoraram a sua posição em 5,1% e 2,0% do PIB, respectivamente, enquanto o déficit estadual/municipal aumentou;
(b) que o trinômio constituído pela SOF, Receita Federal e STN, sob a égide de várias equipes econômicas, foi capaz de criar mecanismos de contenção de gastos/aumento da receita eficientes para manter as contas fiscais sob controle, apesar da vulnerabilidade política dos governos, o que, no contexto da crise dos últimos 15 anos, indica um vigor institucional digno de ser destacado.

FÁBIO GIAMBIAGI, 32, economista do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), é assessor do Ministério do Planejamento. Foi professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) de 1985 a 93.

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