São Paulo, quinta-feira, 22 de junho de 1995
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Cem anos depois

Já se tornou uma obviedade afirmar que o Judiciário brasileiro é lento. Entretanto, uma decisão tomada anteontem pela 3ª Turma do Tribunal Regional Federal do Rio de Janeiro revelou uma nova e inaudita dimensão do conceito de morosidade da Justiça.
O caso se arrasta há cem anos. E não se trata de uma questão muito complexa que envolva longas perícias ou demoradas investigações. Na verdade, é uma ação bastante simples de reintegração de posse, impetrada em 1895 pela princesa Isabel e seu marido, o conde D'Eu, para tentar reaver o palácio da Guanabara, que fora confiscado pela República em 1891.
A princesa perdeu a ação em primeira instância e, inconformada, recorreu ao Supremo Tribunal Federal em 1897. Por obra do acaso ou da astúcia, o processo, se é que de fato chegou aos escaninhos do STF, lá permaneceu engavetado e nunca foi julgado.
Em 1955, 60 anos depois da ação inicial, os descendentes da princesa, já desconfiados de que nunca reaveriam a propriedade do palácio, ajuizaram nova demanda, pleiteando, desta vez, ou a posse do imóvel ou bem uma indenização pela sua expropriação.
No dia 20 de junho de 1995, um século depois da ação inicial, o tribunal decidiu que a petição original não estava prescrita, mas negou aos descendentes tanto a retomada do palácio como o direito a qualquer espécie de indenização.
O pior é que o caso ainda não está encerrado. Os advogados dos herdeiros da família imperial já anunciaram que pretendem recorrer da sentença. Dado o histórico do processo, não seria de estranhar se ele se arrastar por outro século.
É claro que este é um caso provavelmente único -espera-se-, e a Justiça, embora morosa, não costuma levar cem anos para chegar a um veredicto. Ainda assim ela é lenta, lenta demais para de fato proteger os direitos e interesses dos cidadãos. Aperfeiçoar o trâmite das pendências judiciárias sem açodar o Direito é uma obrigação das autoridades de todos os Poderes. A garantia de uma Justiça certeira e relativamente rápida é um dos fundamentos da vida em sociedade.

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