São Paulo, segunda-feira, 26 de junho de 1995
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Gays e lésbicas buscam seu lugar na mídia

ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA

``Visibilidade Lésbica em Beijing", ``Visibilidade e Identidade", ``Mídia Gay e Lésbica" foram temas discutidos pelos ativistas brasileiros e estrangeiros reunidos no Rio de Janeiro durante a última semana.
A preocupação com a visibilidade e com a mídia, na 17ª Conferência da ILGA (Associação Internacional de Gays e Lésbicas), coincide com o espaço crescente dedicado ao tema nos jornais e na televisão.
A própria realização do encontro, encerrado ontem à tarde com uma manifestação na praia, expressa o desejo de que as mais variadas opções sexuais sejam abertamente reconhecidas como legítimas.
E legitimidade se alcança com visibilidade pública. Trata-se de uma disputa política pelo controle das imagens veiculadas na mídia.
Paradas gays e lésbicas não são novidade nos EUA. Lá, há quase vinte anos, homossexuais saem às ruas, a caráter, para assumir publicamente uma identidade.
No estilo americano, politicamente correto, enfrentam a discriminação cara a cara. Preferência sexual lá não é assunto engraçado. É assunto do âmbito político.
Mas o Brasil, e não os Estados Unidos, foi idealizado lá fora como um paraíso gay. O Brasil é conhecido por sua permissividade. É o país de sexualidade liberada, carnaval, travestis e fio dental. Essa fama, contrasta com a pequena visibilidade pública do homossexual no país.
Contrasta também com a baixa repercussão e a impunidade que cerca os casos frequentes de assassinatos de homossexuais. Nossa boa vontade com as diferentes opções se dá à boca pequena, ou através de um silêncio ambíguo.

Exotismo
Há espaço para o exótico. O bofe ou a bicha e mordomos de preferência rompem o silêncio. Talvez até o grande alcance da atual discussão acalorada sobre a sexualidade de Zumbi possa ser entendido nessa chave.
Enquanto a sexualidade de Zumbi polariza, a sugestão de romance gay na atual novela das oito da Globo, ``A Próxima Vítima", passa desapercebida. Dois belos mancebos, estudantes bem resolvidos, um negro e um branco, mantêm um namoro baseado em relações igualitárias.

Tolerância silenciosa
Essa representação é ousada, mas pouco se falou sobre o assunto. Talvez a verbalização aqui rompa com a tradicional regra da tolerância silenciosa.
Muito da vida cultural brasileira passa pelo mundo gay. Somos de uma hipersensualidade hoje já meio andrógena.
Nossa linguagem corporal permissiva permite um espaço ambíguo interessante. Mas embora esse reconhecimento exista ao nível da cultura, ele não se transferiu para o mundo político.
A conferência internacional deu visibilidade inédita às polêmicas entre pedófilos, michês, travestis, ativistas, bissexuais etc.. reunidos em um mesmo fórum. Ela deu uma preenchida no silêncio, que, por sua vez, não deixa de ter a sua graça, pois permite dúvida e sedução. O desafio de ampliar a cidadania continua posto.

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