São Paulo, quarta-feira, 28 de junho de 1995
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Nurembergue de arrabalde

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Ao criticar o ex-ministro Ciro Gomes, José Eduardo de Andrade Vieira, ministro da Agricultura, torna-se o mais novo membro de uma confraria que periodicamente assola a República. A confraria dos que adoram encontrar um Judas -e um só- para todas as besteiras que os governos de turno cometem.
Já foram vítimas da confraria, sucessivamente, Roberto Campos, Delfim Netto e Golbery do Couto e Silva. A bola da vez chama-se Ciro Gomes. A ele são atribuídos todos os defeitos do Plano Real. Aos demais, inclusive e principalmente ao chefe original da equipe, o hoje presidente Fernando Henrique Cardoso, todos os méritos.
Seria apenas ridículo, não fosse também um insulto à inteligência, ao bom senso e aos fatos.
O fato é que Ciro foi apenas o chefe ocasional de uma equipe que incluía, entre outros, Pedro Malan, Pérsio Arida, Edmar Bacha, Clóvis Carvalho e Gustavo Franco. Todos proeminentes figuras da atual equipe governante, exceto Pérsio, recém-desembarcado.
Aí, cabe uma de duas hipóteses:
Hipótese 1 - Todos estavam de acordo com as bobagens de que agora Ciro é acusado isoladamente. Logo, são todos co-responsáveis.
Hipótese 2 - Todos eram contra, mas são capazes de engolir, calados e contentes, as bobagens do chefe de turno, seja qual for o chefe de turno ou a bobagem de turno.
Seja qual for a hipótese correta, não fala bem do comportamento dessa gente toda. Talvez por isso reine constrangido silêncio em torno do tiroteio Ciro Gomes vs. José Serra. Ninguém abre a boca nem para defender Serra nem para defender Ciro. Como se fosse possível que ambos estejam certos.
Não se trata, aqui, de defender Ciro, Serra ou quem quer que seja. Trata-se apenas de não engolir crucificações individualizadas, como se Ciro Gomes fosse o imperador de plantão, capaz de passar por cima tanto do presidente da época como do candidato do presidente da época e de seus companheiros de equipe, com os quais aliás reunia-se praticamente todos os dias, muitas vezes até altas horas da noite.
Se bobagens houve (e de fato houve), falta muita gente nesse nuremberguezinho de quinta que, mais uma vez, se arma na República.

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