São Paulo, quarta-feira, 28 de junho de 1995
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Melhor dizer a verdade

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA - O presidente Fernando Henrique Cardoso e seus assessores produzem um clima de festa para comemorar um ano de Plano Real. Objetivo do lance pirotécnico: manter de pé o otimismo do brasileiro, embalando-o em números reluzentes. Melhor seria contar a dolorosa verdade -antes que seja tarde demais. Explico.
Até agora foi um, digamos, porre. O plano de estabilização veio acompanhado de um festival de compras; atingiram-se níveis de crescimento comparáveis aos do chamado ``milagre econômico" do regime militar. Começa a chegar a ressaca.
Note-se que, apesar de toda a barulheira dos vendedores do caos, o Dieese registrou neste mês aumento do emprego na Grande São Paulo. Mesmo assim, montou-se uma campanha com um toque de histeria, na tentativa patética de passar a idéia de que já se vive em recessão.
Ocorre que o próximo semestre vai mostrar, de fato, o aperto do cinto -as pressões contra o Plano Real vão crescer ainda mais. Isso significa mais espaço aos curandeiros, aqueles que juram possuir uma fórmula mágica de estabilização sem qualquer dor. É um tipo que costuma seduzir políticos à procura de saídas fáceis.
Até agora, as vendas foram maiores em todos os meses comparados aos mesmos períodos de 1994. No próximo semestre, a base de comparação muda. Naquele período, já se vivia a febre de consumo do Real, registrando um patamar alto de produção. Previsível a sensação de pessimismo.
O presidente Fernando Henrique Cardoso e seus ministros fariam melhor se trocassem o foguetório pela franqueza. Ou seja, deveriam assumir que o futuro próximo está repleto de obstáculos e más notícias. Melhor tomar uma aspirina com sal de frutas.
Deveriam ter a ousadia de enfrentar o curandeirismo e informar com muito mais ênfase: há limites para o crescimento, exigindo medidas impopulares. E a sociedade deve ser madura para encarar seus limites, apressando as reformas de suas estruturas.
O problema é que, a julgar pelo oba-oba , o governo parece decidido a estimular a ilusão de que acabar com a inflação não tem preço. O preço da ilusão é, como todos sabem, a decepção.
PS - Um dos traços mais característicos e surpreendentes deste governo é o excesso de professor e a carência de comunicação.

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