São Paulo, quarta-feira, 5 de julho de 1995
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Antes do espanhol

A importância e a riqueza da língua espanhola são indiscutíveis: Cervantes, Lope de Vega, Calderón, Luis de Góngora e Jorge Luis Borges, para citar apenas alguns dos clássicos universais que contribuíram para desnudar a alma humana utilizando-se do idioma espanhol.
É igualmente inegável que a língua de nossos vizinhos ganha ainda mais importância face a consolidação do Mercosul. Mesmo assim, a lei que torna obrigatório o ensino do espanhol nas escolas municipais de 1º e 2º graus, recentemente sancionada pelo prefeito Paulo Maluf, parece bastante inoportuna.
O primeiro e mais eloquente dos argumentos é que, com algum esforço e boa vontade, a comunicação entre brasileiros e hispanófonos já é possível tanto oralmente como pela escrita.
É de se perguntar ainda por que não aprimorar o ensino de inglês, hoje a verdadeira língua mundial, antes de incluir o espanhol no currículo. É certo que a introdução do espanhol por si só não impediria que se ensinasse bem o inglês. Mas a má qualidade do ensino público não permite que se nutram ilusões.
O quadro hoje é desolador: professores desmotivados, mal-remunerados e muitas vezes despreparados, em escolas sem infra-estrutura mínima. Não parece ser o caso de adicionar mais uma disciplina sem a menor garantia de que será bem ministrada. Como agravante, o espanhol não foi ainda incluído na grade curricular. É possível assim que acabe roubando tempo de outras matérias, com prejuízos óbvios.
Se o ensino público já oferece menos qualidade e menos horas letivas que boa parte das escolas particulares, como se pode cortar aulas de matérias essenciais para a formação dos estudantes? Antes de ampliar o leque de matérias, que o prefeito Maluf procure aprimorar as condições de ensino existentes.
Já os vereadores deveriam se abster de propor mudanças nos currículos. As matérias que devem ou não constar de um curso devem ser analisadas por especialistas da área, de forma global, dentro de um programa consistente e de longo prazo. O currículo escolar é importante demais para ser definido por interesses particulares e momentâneos de políticos.

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