São Paulo, quarta-feira, 5 de julho de 1995
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Surpresas

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA - Em entrevista publicada ontem pela Folha, o presidente da Ford do Brasil, Ivan Fonseca e Silva, dá uma péssima notícia -e, natural, apimenta a sinistrose nacional. Segundo ele, haverá mais demissões, devido à ``recessão" no setor automobilístico.
Ele está prevendo vendas ruins nas lojas e concessionárias neste ano. ``Ficaria surpreso se superassem as 110 mil unidades", previu. Diante dessa declaração, fui buscar números para tentar entender o tamanho da crise. Para evitar suspeitas sobre as estatísticas, colhi os dados na Anfavea, entidade que representa as fábricas.
De fato, os números indicam queda nas vendas neste ano -está, em parte, correta a preocupação do presidente da Ford. Mas, no geral, os números são estupendamente positivos. Vejamos.
Peguemos, por exemplo, o mês de junho. Em junho de 1990, as montadoras produziram 27.100 automóveis; em 1991, 50.600; 1992, 51.600. Mais um pulo em 1993, desta vez alcançando 74.473, e, no ano passado, 79.538.
Em todo o ano de 1994 produziram-se 975 mil, o que foi considerado um ótimo desempenho em cima de 1993, classificado de bom pelas montadoras em relação ao ano anterior. Vem 1995, já foram vendidos até maio 424 mil automóveis -mesmo com toda a enxurrada de importados.
A reclamação da Ford reflete o natural desejo de quem quer vender cada vez mais -o que é, diga-se, legítimo. Se um indivíduo esperava ganhar um salário de R$ 5.000, mas, por algum motivo, ficou com R$ 3.000, certamente ele vai ficar aborrecido. Mesmo que seu salário anterior fosse R$ 2.000.
O indivíduo só não pode sair por aí dizendo que está mais pobre. É o que está fazendo, por exemplo, o presidente da Confederação Nacional da Indústria, Mario Amato, para quem o Brasil ``já está em recessão".
Que ele diga que o Brasil vai entrar em recessão, discute-se. Mas se ele garante que já está, sou obrigado a perguntar o que fazemos com o índice do Ipea, apontando crescimento de 8% no primeiro semestre. Com esse tipo de frase, ele se compara ao Amato que previu a fuga dos empresários com a vitória de Lula ou falou sobre a inteligência da mulher.
PS - O discurso da Fiesp sobre o tamanho da crise está exatamente igual ao do PT. Detalhe: a Fiesp sabe o que está defendendo.

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