São Paulo, sábado, 8 de julho de 1995
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Mediação: escolha ou obrigação

AGENOR BARRETO PARENTE

Desde logo é de se acentuar que os profetas do caos, os arautos da fracassomania e as eternas cassandras, dos mais diversos matizes ideológicos, tiveram que se render à evidência de que o Plano Real veio para ficar e representa um marco na economia brasileira. Sua repercussão no campo das relações de trabalho é inquestionável, pois importou na redução acentuada do ``imposto inflacionário", que é tanto mais elevado quanto menor é a renda.
Vista por esse prisma, a desindexação é louvável, na medida em que possa contribuir para um rebaixamento acentuado da inflação. Mesmo antes da indexação, que surgiu em 1964 com Roberto Campos Otávio Bulhões, os tribunais do Trabalho já garantiam os reajustes salariais, como ressalta o Supremo Tribunal Federal (processo 14.493, de março de 1954, relatado pelo ministro Galotti). O que era válido na Constituição de 1946 continua mais solidamente garantido pela Constituição de 1988, em seu art. 114.
O ponto mais negativo da nova medida é que não consegue agilizar a negociação. Burocratiza-a, impondo o mediador ministerial (art. 11º), impedindo que as categorias em disputa resolvam diretamente o conflito e, em caso de impasse, recorram logo à Justiça do Trabalho. Aliás, é o que prevê a Constituição de 1988. De mais, a representação ministerial em São Paulo -onde se situam mais de 50% dos conflitos trabalhistas- não tem condição de atender à demanda que se lhe quer impor, já que, a partir do governo Collor, foi praticamente desmontada.
O inciso II do art. 13 interfere na atividade sindical ao ``vedar" a concessão, a título de produtividade, do aumento de salário não aferido por empresa. Surpreendentemente, a proibição atinge até a negociação coletiva, deitando por terra a liberdade de pactuação das partes. A atomização da atividade sindical imposta pela negociação por empresa importará também numa proliferação dos conflitos nas mesmas, o que seria evitado com uma decisão judicial ou com a convenção coletiva que abrangesse, sem exclusão, tanto a categoria profissional como a econômica em seu todo.
O parágrafo único do art. 13, ao permitir na data-base anual a dedução, não só das antecipações, mas também dos ``aumentos concedidos no período anterior à revisão", é extremamente retrógrado, contrariando orientação de mais de três décadas, segundo a qual ``não são compensáveis os aumentos reais, os oriundos de término de aprendizagem, alcance de maioridade e equiparação", por exemplo.
O restabelecimento do efeito suspensivo traz de volta a legislação do período autoritário, varrida pela democratização das relações de trabalho. Nos casos de greve, por exemplo, os trabalhadores ficarão obrigados a cumprir o julgado que determina a volta ao trabalho, ao passo que os empregadores, com o efeito suspensivo, se eximirão de cumprir a decisão dos tribunais regionais, enquanto não houver novo julgamento que, no geral, pode demorar mais de 12 meses.
Não se pretende que o Executivo abandone o caminho da desindexação. Basta que se deixe às partes liberdade para a negociação coletiva, sem intervenção ministerial; que a mediação ou arbitragem seja uma escolha e não uma obrigação, e ainda que o recurso à Justiça do Trabalho se situe nas lindes da Constituição, com total liberdade.
Com o Congresso em recesso, cabe ao presidente da República aprimorar a medida provisória, expurgando-a de seus aspectos negativos.

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