São Paulo, domingo, 9 de julho de 1995
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TRECHO

Ele mesmo tinha se dado o nome de Cabo Ás de Ouro e gostava demais que o chamassem assim. Era assim que viajava, sentado no pára-lama do caminhão quando o pelotão se deslocava, o vento batendo no rosto, a lança já horizontal a outra mão colhendo as rédeas de couro escarlate o brial de lã chicoteando o vento o cavalo espumando no freio de cana longa levantando poeira as árvores passando de lado zunindo os campos de trigo ficando amarelos para trás o Miranda no outro pára-lama do jipe e o Pereira motorista metendo o pé na tábua de repente um via, mal via, gritava, o Pereira brecava as rodas guinchavam na estrada a gente pulava no chão, o tenente também, depressa-depressa de descobrir as minas -a maioria era telermina 42- passava a mão nelas, puxava no buraco desatarrachava a tampa tirava o detonador jogava tudo fora da estrada pulava no pára-lama de novo o tenente entrava o Pereira engatava uma primeira o jipe roncava pulando em frente já na toda. E ventando lá se ia os olhos no chão procurando sinal de mina na estrada porque a gente tinha que chegar em Collecchio antes da alemãozada que vinha vindo solta por isso estava a fuzileirama toda motorizada empilhada nos caminhões chispando atrás do jipe a poeira nuvens de poeira levantando as patas cadenciadas no chão a lança firme o vento batendo no rosto o capacete brilhando no sol o ás de ouro vermelho se pelo menos ela pudesse ver agora ``você promete que você volta?" a écharpe escocesa na cintura a mão de vez em quando enxugando o rosto ``você promete que você não se arrisca demais promete? Promete nada pensa que eu não te conheço? Você está louco de vontade de ir".
Extraído de "Mina R"

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