São Paulo, domingo, 9 de julho de 1995
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INFERNO DA BIBLIOTECA NACIONAL EM PARIS

ROBERT DARNTON
ESPECIAL PARA "THE NEW YORK REVIEW OF BOOKS"

Falta ao debate corrente sobre a pornografia um elemento que pode ser expresso numa proposição derivada de Lévi-Strauss: sexo dá o que pensar. Em "O Pensamento Selvagem" e outras obras, Lévi-Strauss argumenta que muitos povos não pensam à maneira dos filósofos, ou seja, manipulando abstrações. Em vez disso, eles pensam com coisas -as coisas concretas da vida cotidiana, como as tatuagens e a disposição dos móveis, ou as coisas imaginárias do mito e do folclore, como Brer Rabbit (personagem folclórico norte-americano) e seu canteiro de roseira-brava. Assim como alguns materiais são bons para manipular, certas coisas são especialmente boas para pensar (``bonnes à penser"): é possível dispô-las em padrões que trazem à tona relações inéditas e definem limites antes vagos.
O sexo é, creio eu, uma dessas. Ao se cristalizar em padrões culturais, o conhecimento carnal fornece material inesgotável para o pensamento, especialmente quando aparece em narrativas: piadas sujas, bravata masculina, fofoca feminina, canções licenciosas e romances eróticos. Sob todas essas formas, o sexo não é apenas um tema, mas também um instrumento para rasgar o véu das coisas e explorar seu funcionamento interno. Ele serve assim às pessoas comuns como a lógica serve aos filósofos: ajuda a extrair sentido das coisas. E foi isto o que o sexo fez na época de ouro da pornografia, de 1650 a 1800, especialmente na França.

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