São Paulo, domingo, 9 de julho de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Fantasmas rondam prosperidade argentina

CLÓVIS ROSSI
DO ENVIADO ESPECIAL A BUENOS AIRES

O desemprego recorde, somado às queixas das vítimas principais do programa de estabilização (aposentados, pensionistas e funcionários públicos), criou na Argentina zonas de sombra mesmo em meio à prosperidade dos anos Menem.
Tantas sombras que fizeram até ressurgir, de forma ainda incipiente, fantasmas dos anos trágicos que o país viveu na maior parte de sua história recente.
Um deles corporificou-se de maneira mais intensa na manifestação número cem dos aposentados, em março: o Movimento Popular de Unidade Quebracho, formado em 1992 por militantes desencantados de várias agrupações esquerdistas.
O grupo é responsabilizado pelos incidentes daquela manifestação, durante a qual 25 policiais ficaram feridos.
Na quarta-feira, em entrevista ao matutino ``La Nación", Diego Lovera, 29, estudante de arquitetura e membro do grupo, afirmou:
``Se você quer saber se teríamos pego em armas se tivéssemos vivido na década de 70, digo que sim, sem dúvida."
É um grupo aparentemente minoritário mesmo entre os estudantes, mas o tema inquieta o suficiente para se tornar assunto, na quinta-feira, do programa de entrevistas de maior prestígio no país, o ``Hora Clave", do jornalista e cientista político Mariano Grondona.
Nele, Fernando Esteche, outro militante de Quebracho, disse: ``Vamos quebrar o espelhismo menemista a pedradas".
O outro fantasma está em comunicado emitido quarta-feira pela Adepa (Associação de Entidades Jornalísticas Argentinas). Segundo ele: ``À manifesta intolerância de alguns funcionários públicos ante críticas legítimas se somam agressões físicas e ameaças de certos personagens sinistros que, amparando-se covardemente no anonimato, pretendem cercear o direito a informar".
Foram personagens igualmente sinistros que estiveram, nos 70, do outro lado das barricadas erguidas pelos antecessores do Quebracho.
Pelo menos um deles está de volta ao primeiro plano da política argentina: o general Antonio Domingo Bussi, eleito domingo governador da Província de Tucumán, tradicional reduto do peronismo.
Bussi já fora interventor na Província, durante a ditadura militar (1976-1983). É acusado de pelo menos 400 desaparecimentos de presos políticos, de torturas e de criar campos de concentração.
Esse personagem também esteve no ``Hora Clave" da última quinta-feira para dizer:
``Desaparecidos e campos de concentração não passaram do terreno das denúncias. Denúncias dos derrotados. Não me arrependo de conduzir uma guerra e de ganhá-la".
Bussi considera ``guerra" a repressão indiscriminada conduzida pelo regime militar instalado em 1976, apesar de o atual chefe do Exército, general Martín Balza, ter feito meses atrás o ``mea culpa" da instituição pelos excessos então cometidos.

Texto Anterior: Londres registra novos tumultos; Sérvios prometem admitir comboios; México solta acusados pela morte de Colosio; Golden Gate pode ter grupo anti-suicídio; Ativista americano é preso na China
Próximo Texto: Crise das Províncias ameaça calma social
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.