São Paulo, quarta-feira, 12 de julho de 1995
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Na Pré-História

Um dos poucos consensos entre os historiadores é justamente o de que a História começa com a invenção da escrita. Todo o período anterior aos primeiros pictogramas sumérios gravados em tabletes de argila (``circa" 4.000 a.C.) recebe o nome de Pré-História.
A importância da invenção da escrita para o desenvolvimento ulterior da humanidade pode ser medido pelo atual estágio tecnológico do mundo. Da revolução da microinformática, passando pelas viagens espaciais até atos bastante mais prosaicos como tomar sozinho um Metrô, tudo isso seria impensável se não fosse a escrita, esses notáveis rabiscos que permitem a transmissão e o acúmulo de conhecimento, e sem a qual os homens ainda estariam vivendo em cavernas ou palhoças.
O Brasil, infelizmente, ainda conta com 30,5 milhões de cidadãos que vivem na Pré-História: são os 20,7% de analfabetos aferidos pelo último censo do IBGE, em 1991. O pior é que esse é um quadro bastante otimista. A precariedade dos critérios do IBGE para qualificar alguém como alfabetizado -basta ser capaz de assinar o próprio nome- faz supor que a situação real em termos de semi-analfabetismo e analfabetismo funcional (o sujeito que é capaz de pronunciar correta e fluentemente as palavras que lê sem contudo entender o que está lendo) seja muito mais dramática.
Como se isso tudo já não fosse terrivelmente assustador, as perspectivas de extinção do analfabetismo no Brasil são medíocres, para dizer o mínimo. No atual ritmo dos programas de educação, a cada dez anos o país consegue reduzir em apenas cinco pontos percentuais o número de analfabetos. No ano 2000 eles ainda deverão ser 15% da população; a erradicação, a continuar no passo de hoje, parece inatingível antes do remoto ano de 2030. A situação é vexatória quando se considera que alguns países como a Islândia desconhecem a chaga do analfabetismo já desde o último ano do século 18.
Apenas para não parecer excessivamente pessimista há que se recordar que existem países em situação bem pior que o Brasil. Um único e curioso exemplo é o atual Iraque, que é, ``mutatis mutandis", o país inventor da primeira escrita. Lá, 40% da população ainda é incapaz de ler ou escrever.
Reverter as sombrias projeções do IBGE e adotar imediatamente um programa eficaz e rápido de erradicação do analfabetismo é o mínimo que a sociedade pode cobrar das autoridades.

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