São Paulo, terça-feira, 18 de julho de 1995
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Explodir a letargia

ANTONIO CARLOS DE FARIA

RIO DE JANEIRO - A explosão do depósito da Marinha não fez vítimas entre os moradores vizinhos, apesar da violência dos estrondos. Mas por que havia a possibilidade do risco? Por que há milhares de moradores tão perto de um depósito de munições?
As perguntas se repetirão, caso se olhe para outras cidades do país. Por que pessoas podem morar em ribanceiras íngremes, por que podem estar nas margens de rios que transbordam ou, preocupação mais recente, por que podem se estabelecer em áreas de proteção ambiental?
A miséria, a falta de planejamento urbano, a falta de escrúpulos dos exploradores imobiliários, a omissão das prefeituras são algumas das respostas para esses questionamentos.
São respostas que só se completam diante do silêncio tácito que permite a existência dessas condições degradantes de vida. É preciso uma mobilização contra a crônica desses desastres anunciados.

A explosão ocorreu no mesmo local de onde foram roubadas mais de 20 mil balas, no ano passado. Mediante um acordo, os ladrões devolveram metade das balas para a Marinha, a outra parte deve ter ido abastecer quadrilhas de traficantes do Rio.
O roubo das balas e a entrada no país de mais de 300 armas, na semana passada, são ingredientes de uma sopa que provoca calafrios ao mostrar o quanto a sociedade é vulnerável.
No caso das armas, o episódio foi chocante ao esclarecer como é o processo de importação. Mediante guias legais, centenas de armamentos sofisticados puderam entrar pelo aeroporto internacional, enquanto a sociedade gasta tempo em debater formas de controlar a violência.
As armas estão retidas num depósito, e a Polícia Federal abriu um inquérito para apurar possíveis irregularidades na sua compra e futura distribuição.
Nos momentos das tragédias previsíveis, quando as vítimas lembram o descaso geral, inquéritos são instalados para aplacar consciências. Esforço inútil se não houver punições, se não houver quem se arrependa.

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