São Paulo, sexta-feira, 21 de julho de 1995
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`Camarim' não se decide pelo besteirol

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Talvez o problema desta ``Senhora do Camarim" esteja na ausência de uma opção entre o besteirol, como no hilariante quadro da estrela de teatro em ``A Bofetada", ou o drama de bastidores, como no filme ``The Dresser" ou ``O Fiel Camareiro", tirado da peça de Ronald Harwood.
Renato Borghi, um comediante formado no palco quando ainda existiam os comediantes, caminha decididamente para o primeiro caso, para o besteirol mais aberto e engraçado, como ator; mas está preso ao segundo, ao drama de camarim, como autor.
``Senhora do Camarim", no que tem de melhor, é um besteirol carregado de cacos, ou ainda de observações, algumas cortantes, outras quase históricas, tiradas da experiência já longa do grande ator no teatro.
Renato Borghi não dá nomes, apenas um e outro mais distantes, como o de Araci Cortes, estrela das revistas, esquecida pela história oficial mas que sobrevive quase como lenda. Borghi não dá nomes, mas retrata da maneira mais escrachada, como seria próprio de uma camareira experiente e desrespeitosa, os conflitos entre estrelas como Tônia Carrero e Cacilda Becker, ou Fernanda Montenegro, ou até as mais jovens.
Um Renato Borghi ``drag" faz rir à solta, derrubando a frieza do público mais fechado, andando em meio à platéia, falando diretamente à primeira fila, parecendo estar mesmo em casa, à vontade.
Mas o drama não demora a chamar, com o clichê do jovem amante que trai a velha estrela, aliás, resultando em cenas com um propósito por demais óbvio e frustrado de chocar, como o beijo e coisas mais entre o pai Renato Borghi e o filho Ariel Borghi.
A morte ao final, ainda que com o golpe de metalinguagem da entrada da própria camareira, encerra e resume o dramalhão.

``O Fabuloso Obsceno", mais do que ``Camarim", é o que se chama de veículo, para um ator conhecido; no Brasil, hoje, sempre um veículo para um ator de televisão; no caso, Osmar Prado. Não à toa, a estréia foi programada para a semana de estréia de uma telenovela, que ele protagoniza.
Mas o que poderia ser um desastre, como tantos em que o palco é mero apêndice financeiro da TV, revela-se um esforço sincero de interpretação.
A comédia de Dario Fo, de ``Morte Acidental de um Anarquista" e ``Mistério Bufo", é um amontoado de obscenidades. É dividida em duas partes, a primeira um esquete menor e desnecessário, a segunda, chamada ``O Tumulto em Bolonha", uma interminável e muito engraçada piada em torno de ``uma arma poderosa".
A arma do povo, usada contra os poderosos que se refugiam num castelo, com todo o dinheiro e toda a comida, são as fezes. Elas são atiradas contra o castelo até que vence o povo, sobre os nobres e os padres, que saem sujos.
Uma fábula obscena, grosseira, que Osmar Prado interpreta com disposição e agilidade inesperadas. O ator usa recursos de circo, corre pelo palco, faz todos os personagens imagináveis, alcançando afinal, pelo histrionismo, o público.
Fosse isso a peça, sem a patética primeira parte e as canções andinas ou caipiras que o ator interpreta, e ``O Fabuloso Obsceno" seria uma bela comédia obscena.

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