São Paulo, sábado, 22 de julho de 1995
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Súmulas vinculantes: a involução do Judiciário

ANTONIO CARLOS VILLEN

Mais que indagar se as críticas do senador Antônio CArlos Magalhães ao Judiciário são movidas por interesse público, importante é buscar soluções para os problemas que apontam e evitar inovações apressadas no ordenamento.
Segundo noticiado no últino dia 6 de julho pela Folha, o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Octávio Galloti, reconhece a existência de indesejada lentidão no judiciário e sugere a adoção das súmulas vinculantes.
Elas consistiriam na fixação do entendimento dos tribunais superiores sobre temas relevantes da vida nacional, com caráter vinculante para os demais juízes. Se introduzidas no ordenamento, representarão um caminho de, no mínimo, difícil retorno.
O mais grave é que contribuirão para solapar a liberdade de decidir dos juízes, que estarão manietados por entendimentos fixados pelas cúpulas. Além do risco de edição da jurisprudência, que deixará de sofrer os influxos da saudável discussão daqueles temas pelos magistrados.
Juízes burocratas serão poupados de muito trabalho, o que não significa que a sociedade será poupada de sobressaltos causados por súmulas que a história poderá demonstrar equivocadas.
O sistema atual apresenta distorções que, aliás, se iniciam por uma labiríntica distribuição de competências entre as várias justiças -Comum Estadual, Federal, do Trabalho, Eleitoral, Militar.
Bem ou mal, no entanto, foi esse sistema que garantiu a liberação dos cruzados no vergonhoso bloqueio determinado pelo governo Collor.
Certo ou errado, é ele que ainda garante, num momento emergencial em que o tema praticamente começa a ser discutido, que o tratamento de aidéticos seja coberto pelos planos de saúde.
Foram também a independência e liberdade de decidir dos juízes que proporcionaram o avanço da jurisprudência no sentido de começar a exigir, de governantes comprometidos apenas com as inaugurações de sua gestão, que os depósitos nas imissões provisórias de posse em desapropriações por utilidade pública deixassem de ser uma chacota.
O que aconteceria se, a respeito desses temas, houvesse súmulas fixando entendimento contrário ao dos juízes de primeira instância? Aconteceria que, diante de pequenos poupadores cujos recursos proporcionavam verdadeiras farras presidenciais, diante de doentes terminais perecendo sem assistência médica e diante de expropriados residindo em viadutos, os juízes não teriam mais nenhum motivo para preocupação. Afinal, existiriam súmulas vinculantes que decidiriam por eles.
Se quisermos transformar o cargo de magistrado em mero ``emprego", sem compromisso com os interesses da sociedade, as súmulas vinculantes realmente serão um instrumento precioso. No Brasil, vivemos época de águas turvas.
Nelas, malvadas iscas costumam proliferar.

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