São Paulo, sábado, 22 de julho de 1995
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Biografia questiona o mito Walt Disney

Marc Eliot tenta desvendar lado sombrio do `herói'

MARCELO REZENDE
DA REPORTAGEM LOCAL

Quando se escava a vida de um homem, deve imaginar um biógrafo-modelo, com um certo grau de persistência sempre é possível encontrar a imperfeição de que é feito o gênio.
Algo que pode se agravar quando o homem, no caso, é o herói mítico da inocência cinematográfica, como em ``Walt Disney - O Príncipe Sombrio de Hollywood", do americano Marc Eliot, biografia do produtor americano morto em 1966, que a editora Marco Zero lança agora no mercado.
Eliot está no Brasil para o lançamento do livro e, em entrevista à Folha, disse que sentiu a necessidade de biografar Disney por um essencial motivo: romper um silêncio de 29 anos. ``Tanto tempo depois de sua morte, Disney ainda era tratado como uma espécie de tio, uma figura inocente. E apesar de já haver mais de três biografias no mercado, o fato é que ninguém ainda havia dado conta do personagem", diz.
E a maneira que Eliot encontrou para colocar o maior produtor de animação do cinema em foco foi pesquisar todos os documentos, livres para consulta, do governo norte-americano.
Tudo para provar que, além de realizador de obras como ``A Bela Adormecida" e ``Branca de Neve", Disney também era um arrivista, anticomunista e, como se não bastasse, adorava, quando criança, se trancar no quarto e usar a maquiagem da mãe. Enfim, para Marc Eliot, o homem que fez ``Bambi" era um pervertido.
Todo o livro é construído por meio de documentações e entrevistas com pessoas que trabalharam com Disney.
Pessoas, afirma o autor, que se sentiram aliviadas e agradecidas com o projeto da biografia: ``Os familiares de Disney não gostaram muito do livro, mas seus companheiros de trabalho, sim, já que nunca puderam se manifestar. Disney nunca foi capaz de dividir nada com ninguém. E alguns talentos sofreram no estúdio. Em especial Carl Barks".
Barks foi o desenhista que legou o Pato Donald como o conhecemos e um dos maiores talentos que trabalharam com Disney.
Quando nasceu, em 1901, de ``uma longa linhagem de cruzados, que tinham como finalidade primeira sobreviver", como explica Eliot em seu livro, Disney nem imaginava que um dia teria profundas relações com a direita americana e o movimento macarthista, que pregava uma América apenas para os americanos.
O que significava, nos anos 50, caçar todo aquele que, no mínimo por suspeita, tivesse afinidades com o comunismo.
Se as histórias do envolvimento de Disney com a ala mais conservadora do governo americano não são novidades, Eliot se gaba de conseguir documentá-las.
E nem o argumento de que essa postura era comum a todos os chefes dos grandes estúdios arrefece a importância do fato: ``Isso é pior nele, porque sua imagem foi moldada para que permanecesse um puro para o público."
Uma pureza que necessita ser repensada também pelo que representam, hoje, as criações dos estúdios de Walt Disney: ``É necessário, agora que sabemos como é o homem, tentar identificar como suas crenças são representadas nos desenhos criados pelos estúdios". Com a palavra, ``Pocahontas".

Livro: Walt Disney - O príncipe Sombrio de Hollywood
Autor: Marc Eliot
Tradução: Leiko Gotoda
Lançamento: Marco Zero
Preço: R$ 36,40

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