São Paulo, sábado, 22 de julho de 1995
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Como nasce um tema

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Suspeito que, ao contrário do que sugere o noticiário, o tema reeleição ou duração do mandato presidencial não está ainda na agenda de Fernando Henrique Cardoso.
O ainda, no caso, é fundamental. Não há presidente que não pense no seu futuro político, o que implica discutir a possibilidade de reeleger-se, quando ela é vedada, como ocorre no Brasil.
Mas parece cedo para tratar disso a fundo. Se o noticiário indica o contrário, trata-se de efeito de uma dinâmica própria do jornalismo. Funciona mais ou menos assim:
1 - Alguém pergunta a alguém o que ele acha de reeleição presidencial. No caso específico, fez-se tal pergunta a Itamar Franco, ex-presidente. Ele respondeu e saiu nos jornais.
2 - Publicada a resposta, a pauta de qualquer repórter que se preze é perguntar ao presidente de turno o que ele acha. Foi o que se fez com FHC em Lisboa.
3 - O presidente de turno responde, e, como é natural, sua resposta também vai para os jornais. Não raro, outras pessoas dão palpite a respeito, ou porque viram o tema nos jornais ou porque alguém viu e lhes perguntou.
Pronto. Está montado um tema. Se apareceu vários dias seguidos nos jornais, dá a sensação de que não se fala em outra coisa.
Pode não ser bem assim. Acontece que, em Brasília, são mais limitadas as chances de se fazer perguntas ao presidente, a menos, é óbvio, que ele convoque uma entrevista coletiva ou convide um jornalista para conversar.
Já no exterior, é tanto entra e sai de um local para outro, que a autoridade fica mais disponível. Não sei se disponível é a palavra certa. No mais das vezes, ele é prensado mesmo, no que costumo chamar de cenas de jornalismo explícito. Ou seja, uma autoridade xis cercada de microfones e gravadores por todos os lados, até no céu da boca.
Aí, é pergunta à queima-roupa e resposta idem. Vira assunto, mesmo que o presidente só tenha pensado nele ao ser prensado, se é que se pode pensar no meio do aperto.
Depois, o tema volta a mofar até que de fato só se pense naquilo.

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