São Paulo, domingo, 23 de julho de 1995
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Lojas pequenas `entregam os pontos'

MÁRCIA DE CHIARA; GRAZIELE DO VAL
DA REPORTAGEM LOCAL

Para cada pequena loja que fechou as portas desde a entrada do real no Estado de São Paulo, outras três encerraram as atividades sem dar baixa na Junta Comercial.
Isso é o que revela o estudo do Sindicato das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte do Comércio do Estado de São Paulo.
``Cerca de 20% das lojas que surgiram nos últimos 12 meses não existem mais", diz Francisco Miéle, presidente do sindicato dos pequenos lojistas.
As estatísticas, segundo ele, são ``maquiadas".
O número de empresas que fechou as portas é muito maior do que indicam os dados oficiais.
Na prática, como há um custo para regularizar o encerramento da atividade na Junta Comercial, os pequenos comerciantes preferem simplesmente ``baixar as portas e entregar os pontos".
Pelos cálculos do sindicato, 12 mil empregados do setor foram dispensados nos últimos três meses, por causa da queda nas vendas e da falência das empresas.
Segundo Miéle, as lojas menores foram as mais atingidas pelos juros altos e pelas medidas de contenção ao crédito baixadas pelo governo, na tentativa de segurar o consumo.
Motivo: o pequeno empresário, na maioria das vezes, confunde a contabilidade do orçamento familiar com a do próprio negócio.
``Ele usa o cheque especial para fazer as compras da loja e vice-versa", afirma Miéle.

Confusão
Marlei da Silva Oliveira, proprietária de uma loja de artigos para decoração de interiores na zona sul de São Paulo, é um exemplo típico desta confusão.
``Os negócios da minha empresa começaram a se complicar desde que o governo proibiu as operações de factoring", diz ela.
O factoring é um tipo de operação em que o comerciante desconta os cheques pré-datados junto a uma empresa de crédito.
Antes da restrição ao factoring, conta Marlei, era possível ter facilmente dinheiro em mãos para cobrir as despesas do mês.
Isso permitia que a ela comprasse à vista dos fornecedores e ainda com um bom desconto.
Desde março, no entanto, quando o governo proibiu o factoring, o quadro se agravou.
``Hoje tenho que utilizar pré-datados para comprar meu estoque", diz a empresária.
Com isso, Marlei não está conseguindo mais os descontos juntos aos fornecedores.
Pior: os seus produtos estão menos competitivos porque ela paga mais pela matéria-prima.
``Minhas vendas caíram 70% desde março. Vou esperar até o final do ano. Se não melhorarem, fecho as portas."
Na opinião dela, esta é pior crise para os pequenos comerciantes nos últimos cinco anos.
Segundo o Miguel Roberto Gherrize, sócio da empresa de consultoria Arthur Andersen, a arma dos pequenos lojistas para competir com os grandes hoje é oferecer serviços e produtos diversificados.

Avanço dos grandes
Para Emílio Alfieri, economista da Associação Comercial de São Paulo, as grandes redes de lojas estão avançando exatamente no espaço que os pequenos estão perdendo no mercado.
``A tendência era de que, com a queda da inflação, os consumidores dessem preferência às lojas de bairro, já que a diferença de preços seria menor", diz o consultor Gustavo Ayala.
Mas, segundo Alfieri, a inadimplência recorde e os ``pacotinhos" anticonsumo atropelaram os pequenos comerciantes.
Os números de consultas ao sindicato já refletem o receio dos pequenos lojistas.
Miéle conta que, depois do Plano Real, a entidade chegou a receber 20 consultas diárias de pessoas interessadas em abrir uma loja. Hoje esse número passa de seis.
(MCh e GV)

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