São Paulo, domingo, 23 de julho de 1995
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A lição do mestre

SÍLVIO LANCELLOTTI

Nos meus tempos de curso científico no colégio Rio Branco, o grande professor Zeno Georgean costumava afirmar que a sua matemática só tinha uma invirtude: era integralmente lógica.
O mestre Zeno apreciava a poesia dos desafios imprevisíveis e convidava os alunos ao exercício do braço-de-ferro em sua mesa.
Embora sempre vencesse, o professor, dono de bíceps monumentais, usava o exemplo do braço-de-ferro com o argumento de um belo raciocínio: um estudante pode e deve, sem medo, enfrentar o seu mestre. Do confronto saudável das idéias nascem as soluções dos maiores problemas. Não me esqueço de Zeno Georgean.
Por isso, hoje, contra a poderosa maré montante, eu ouso uma defesa do peruano Alberto Tejada.
Em 93, na véspera do jogo decisivo entre o Brasil e o Uruguai, a editoria de Esporte da Folha pediu que eu pesquisasse o seu currículo. Temia-se que Tejada pudesse prejudicar o Brasil.
Tranquilizei a Redação ao escrever que sua indicação parecia ``correta e confiável". Não havia na carreira de Tejada nada de controvertido ou desabonador. Não creio em desonestidade no gol de Túlio. Inclusive porque uma imagem publicada em um diário uruguaio de certa maneira isenta Tejada da responsabilidade total.
No lance, o árbitro vira o corpo na direção do seu auxiliar, o boliviano Humberto Aliaga. Imagino Tejada mais preocupado com a possibilidade de um impedimento do que um toque de braço. Bastaria uma piscadela, naquele exato momento, bastaria o espocar de um flash de fotógrafo, para comprometer sua visão, sua decisão.
Um ex-mediador, o italiano Brunero Massi, hoje dono de cantina em São Paulo, costuma afirmar: ``É fácil apitar uma partida de casa, diante da TV, com a ajuda do replay. É fácil apitar uma partida na máquina de escrever".
Concordo. Não existe profissão mais infernalmente devastadora do que aquela de árbitro de futebol.
Por isso, prefiro me desviar do erro trágico de Tejada e insistir em outro tema: denunciar a monumental incompetência do pedante Daniel Alberto Passarella, um vigoroso machão como atleta e, incrivelmente, um emasculador como treinador. Na escalação, na postura tática e nas substituições, Passarella levou sua equipe a um patético suicídio diante do Brasil. Nem batedores de pênalti soube escolher.
Diria de Passarella o mestre Zeno: no banco, não passa de um zero à esquerda.

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