São Paulo, sexta-feira, 4 de agosto de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Sobre incentivos fiscais e ICMS

MAILSON DA NÓBREGA

Nos últimos dias, nasceu um esporte de âmbito nacional: falar de ICMS, IVA, IVV, federalização, autonomia estadual, incentivos, guerra fiscal. Como no futebol, todos são entendidos e apaixonados. Eis algumas informações úteis para acompanhar a peleja.
IVA e IVV - Siglas para "Imposto sobre o Valor Agregado e "Imposto sobre Vendas a Varejo. Ambos incidem sobre o consumo. No IVA, método mais usado em todo o mundo, a cobrança é feita sobre o que se agrega em cada etapa da cadeia produtiva. No IVV, ou ``sales tax", arrecada-se apenas na venda ao consumidor. No Brasil, o ICMS (estadual) e o IPI (federal, incidente sobre certos produtos da indústria) são exemplos imperfeitos do IVA, pois os serviços são tributados pelos municípios.
Federalização do ICMS - Tem duplo sentido: (1) arrecadação do tributo pelo governo federal, com posterior distribuição às unidades da Federação ou (2) normas básicas de caráter nacional, com limites aos Estados para alterá-las. Ninguém de bom senso pensa ser possível centralizar a cobrança do ICMS. Quanto às normas, já são nacionais há 27 anos e continuarão assim conforme a atual Constituição, que determina a regulamentação da matéria por lei complementar. A discussão é bizantina.
Autonomia estadual - Cláusula pétrea da Constituição. E inalterável. Não confundir com liberdade para os Estados alterarem as normas do ICMS a seu bel-prazer. Seria anarquia. Na tributação sobre o valor agregado, as alíquotas e a base de cálculo devem ser harmônicas em todo o território. Do contrário, haverá ineficiência na alocação dos recursos da economia.
Não comparar com os Estados Unidos, pois no caso do ``sales tax" não é problema a diferenciação tributária entre os Estados. Comparar com a União Européia, que vem buscando exatamente a harmonização.
Incentivos fiscais do ICMS - Possíveis para o produto. Exemplo: pode-se isentar ou cobrar menos nos alimentos. É, em tese, impossível para a empresa, pois no método do valor agregado o tributo sobre o bem será sempre restabelecido mais à frente. Se um Estado isenta a empresa, a nota fiscal sairá sem o crédito do ICMS. Na etapa seguinte, o imposto incidirá sobre a venda total. Terá havido mero adiamento e o outro Estado é que arrecadará.
Os incentivos existentes para a empresa são financeiros: concede-se um empréstimo subsidiado para pagamento do ICMS ou se amplia o prazo de recolhimento. Neste caso, têm que ser aceitos por todos os Estados. Do contrário, é inconstitucional.
Guerra fiscal - Disputa de investimentos mediante oferta de vantagens do ICMS para instalação de indústrias no território do Estado. Cria ambiente para que empresas leiloem a localização de seus empreendimentos.
A vantagem fiscal nem sempre é decisiva. O incentivo equivale à devolução total ou parcial do imposto, em geral com desbragada desobediência à lei. Cabe ação judicial do prejudicado: o cidadão, a empresa ou o Estado. A morosidade da Justiça e a complacência diante do delito estimulam a guerra. No final, todos perdem.
O tema vem adquirindo cores emocionais. Basta ver as reuniões de governadores e as incríveis declarações de autoridades estaduais fazendo a apologia da guerra fiscal. Opiniões de leigos contribuem para poluir o debate. Se o clima não for clareado, a desinformação e a paixão podem ser os ingredientes para uma reforma tributária malfeita.

Texto Anterior: Perspectiva do credor; Hora de pagar; Saldo do caminhonaço; Com carteirinha; Fora do páreo; Em recuperação; Sem relaxar; Chapéu alheio
Próximo Texto: Ilusão monetária reversa
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.