São Paulo, domingo, 6 de agosto de 1995
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O paradoxo de Hiroshima

Há 50 anos o B-52 Enola Gay despejava sobre Hiroshima a primeira bomba atômica usada com fins bélicos; 110 mil pessoas pereceram. Três dias depois foi a vez de Nagasaki; 60 mil mortos. Em 2 de setembro, o Japão capitulava incondicionalmente aos aliados. Inaugurava-se a era atômica.
A primeira pergunta é: era necessário? Difícil dizer. Cálculos norte-americanos procuram justificar a ação alegando que mais pessoas teriam morrido se a guerra convencional prosseguisse e os EUA tentassem ocupar o arquipélago. Como isso não aconteceu, fica difícil raciocinar em cima de hipóteses.
O fato é que, derrotada a Alemanha, o Exército russo se concentrava em combater o Japão. Os EUA não estavam dispostos a dividir a vitória e o território com os russos, como ocorrera na Alemanha.
Outro ponto importante é que o impacto da bomba sobre uma cidade tinha de ser testado. Ninguém, nem mesmo os cientistas do projeto Manhattan, sabia ao certo quais seriam os efeitos da bomba sobre a população civil. Nesse sentido, o ataque foi mais ou menos uma ``experiência científica".
Os EUA mostraram ao mundo que, com sua nova arma, haviam se tornado uma potência imbatível, situação que perduraria até 1949, quando os soviéticos detonaram a sua primeira bomba em testes.
Desde de o ataque a Nagasaki, nenhuma outra bomba atômica foi usada em combates, e, paradoxalmente, elas são hoje dezenas de vezes mais poderosas que a original.
Num certo sentido, o relativo equilíbrio que se consolidou a partir de 49 e se convencionou chamar de equilíbrio do terror poupou o mundo de conflitos bélicos generalizados, apesar de importantes guerras localizadas. As bombas e o seu poder de destruição faziam com que as duas partes envolvidas respeitassem o inimigo, sabendo quando recuar. A guerra era ``fria".
A Guerra Fria acabou. Mas a CEI conserva parte do arsenal da extinta URSS, e outras nações como China, França e Reino Unido e -suspeita-se- Israel, Índia, Paquistão e África do Sul desenvolveram também eles seus artefatos nucleares, o que em certo sentido garante que a era das guerras generalizadas já passou. O preço, contudo, foi alto: 170 mil pessoas pereceram para que essa arma paradoxal mostrasse ao mundo um poder de destruição tão grande que forçou os dois ex-inimigos -EUA e URSS- a travar uma luta sem guerra.

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