São Paulo, segunda-feira, 7 de agosto de 1995
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A campanha contra Jatene

LUÍS NASSIF

A campanha encetada contra o ministro da Saúde, Adib Jatene, é típica da mediocridade generalizada que acomete a discussão pública.
Nos últimos tempos, tentar desqualificar o oponente -quando não se consegue rebater seus argumentos- virou esporte nacional, à mão de qualquer medíocre.
Tem-se uma questão concreta -a crise que acomete a saúde. O que diz o ministro? O sistema tributário brasileiro só beneficia uma parcela de privilegiados e o mínimo que uma nação civilizada precisa fazer é dispor de recursos para atender às necessidades básicas de seus habitantes.
Nenhuma das alegações contra o dr. Jatene nem sequer arranha a lógica de seus argumentos. A maior desconfiança contra a vinculação de tributos para a saúde -de que, mais tarde, o dinheiro seja desviado para outras funções- é culpa do excesso de esperteza do então ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso, que resolveu chamar de social um fundo que visava exclusivamente flexibilizar recursos do orçamento para despesas variadas.

Slogans e realidade
A capa da revista ``Veja" desta semana sobre a questão é bastante significativa para entender esse estilo manipulatório ao qual recorrem muitas autoridades.
A capa tem duas partes. A primeira, feita em cima de argumentos dos setores do governo contrários ao aumento dos gastos para a saúde, é um apanhado do arsenal de slogans e manipulações despejados contra o ministro.
Nela, Jatene é apresentado como um demagogo, que anda de avião de carreira para poder fazer bonito para os demais passageiros (!!!), batalha pelos pobres porque tem pretensões políticas -embora não se avance uma evidência sequer para comprovar a insinuação. A saúde é um saco sem fundos, coalhada de fraudes por todos os lados, de tal maneira que bastaria coibir as fraudes para nadar em dinheiro.
A segunda parte, indo atrás de fatos objetivos, descreve uma realidade totalmente oposta. Mostra o ridículo dos pagamentos feitos a hospitais e descreve o extraordinário trabalho que está sendo desenvolvido pelo Sistema Unificado de Saúde, com a instituição de controles sociais sobre as verbas do setor. Trabalho, saliente-se, que só poderá ser completado na medida em que o ministério dispuser de garantia de pagamento aos municípios.
A coluna -que foi bastante crítica em relação aos primeiros atos do ministro- reconhece nele um grande brasileiro, um homem que, sendo próspero e bem-sucedido profissionalmente, não se prendeu a essa execrável solidariedade de classe que marca tantos desses medíocres que consideram todo gasto social como desperdício.
O que se tem de cobrar do ministro é a radicalização do modelo de municipalização da saúde. Não se esconder atrás de casos de desvio de verbas para ocultar a falta efetiva de recursos para o setor.
Não se está falando de benefícios para a venda do Banco Econômico, de subsídios para usineiros nordestinos, de superfaturamento para empreiteiras, de recursos do BNDES para grupos econômicos, de nomeações de políticos para teles estaduais ou de taxas de juros e câmbio que estão permitindo os maiores lucros da história para alguns grupos financeiros.
Talvez por isso é que haja tanta resistência a se resolver a questão.

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