São Paulo, domingo, 13 de agosto de 1995
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Internet causa frenesi na Bolsa de Nova York

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Algumas tecnologias da informação têm sido superestimadas. Tem gente que se aproveita da moda para ganhar dinheiro explorando uma mistura explosiva de ignorância e curiosidade.
Na semana passada, esse frenesi atingiu um momento de clímax com a valorização estratosférica das ações emitidas pela Netscape na Bolsa de Nova York.
A Netscape é uma empresa nova, praticamente sem faturamento, cujo principal produto é um programa que permite navegar pela rede. O dono da empresa já é vendido como uma espécie de novo Bill Gates, o bilionário que criou o padrão Windows e se tornou o homem mais rico do mundo.
Em Wall Street, a megavalorização da Netscape foi vista com preocupação. Afinal, por mais que as novas tecnologias da informação sejam promissoras, os fundamentos da economia norte-americana estão ainda longe de justificar uma euforia sustentável com a valorização de seja lá o que for.
O que pouca gente diz é que a Internet e os lugares que já se pode visitar com o Netscape são em muitos casos algo ainda mais próximo de um canteiro de obras do que de um fabuloso shopping center recém-inaugurado.
É verdade que há vários serviços excelentes que já estão disponíveis. Mas em muitos casos, no momento de assinar um desses serviços, surge na tela um lembrete singelo e ameaçador: ``Você tem certeza de que deseja prosseguir?". O alerta lembra que sua senha pode ser capturada por terceiros e torna a decisão de prosseguir algo no mínimo preocupante.
Há também serviços muito louvados, mas bastante ridículos, como encomendar pizzas pela rede. O sujeito precisa estar num grau de dependência da máquina elevadíssimo para valorizar a possibilidade de pedir uma pizza sem ter de levantar da cadeira onde está jogando seu video game ou acabando um relatório da empresa.
O fato objetivo é que a rede ainda está em construção em todos os níveis, do hardware à compreensão mais sutil do alcance e das formas mais adequadas ao novo meio. Em muitos ``sites" (pontos de acesso a serviços) é comum encontrar outro alerta quanto à provável desatualização das indicações. Ou seja, o ``surfista" acha que vai pegar a maior onda e dá de cara com um ``site" que não existe mais ou que foi desativado.
Naturalmente, nada disso diminui a importância da Internet e das novas mídias, softwares e serviços a ela associados. Mas são fatos reais que ajudam a entender que navegar na rede pode ser algo mais difícil e frustrante do que o marketing atual dá a entender.
O resultado é que a indústria do software e a própria estrutura da Internet provavelmente terão de desenvolver formas e instrumentos de acesso muito melhores que as atuais. Pode até mesmo ocorrer, em breve, de a Internet desaparecer tal como se apresenta, substituída, por exemplo, por aparelhos de televisão operados com controles remotos infinitamente mais amigáveis que uma conexão Internet pura, operada com um Netscape.
Nos EUA essa tendência já se torna visível. Apesar do frenesi com o Netscape, nas últimas semanas viram-se fusões envolvendo empresas de comunicações cujos produtos provavelmente farão da Internet uma mídia da Idade da Pedra da era da informação.

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