São Paulo, sexta-feira, 18 de agosto de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Não vamos virar o barco em que estamos

IRINEU SOUZA FRANCISCO

O recente episódio do fechamento da Brazilian Food, considerada uma das maiores empresas de refeição-convênio do país, além de causar prejuízos a muitos estabelecimentos credenciados, por deixar de ressarcir documentos de compra que havia emitido, ameaça provocar danos mais graves a todo o sistema.
Em decorrência desse fato, algumas das grandes redes de supermercados e restaurantes colocaram todo o setor sob suspeita e passaram a fazer exigências impraticáveis, que podem até inviabilizar o sistema.
Evidentemente, as pequenas e médias empresas de refeição-convênio são as mais atingidas por essa pressão, embora não tenham a menor culpa do que ocorreu.
É importante assinalar que o PAT (Programa de Alimentação do Trabalhador), que deu origem ao sistema de refeição-convênio, está completando 20 anos. Nesse período, graças ao crescente número de trabalhadores por ele beneficiados, foram abertos milhares de bares e restaurantes e inúmeras redes tiveram extraordinário crescimento. Criaram-se os sistemas de self-service populares e também as refeições por quilo, disseminados por todo o país.
Pelos números mais recentes do Ministério do Trabalho, o PAT registra a concessão do benefício a mais de 10 milhões de trabalhadores. Desses, 40% recebem refeições no local de trabalho, enquanto o restante, cerca de 6 milhões, alimenta-se diariamente numa rede credenciada com mais de 240 mil estabelecimentos, pagando com os chamados tíquetes, cheques-refeição ou similares.
Nesses 20 anos de sistema baseado na parceria e na confiança entre as empresas de refeição-convênio e os restaurantes e bares, esta é a primeira vez que uma empresa do setor causa prejuízos aos seus conveniados. Nesse mesmo período, quantas organizações comerciais, industriais ou financeiras fecharam, causando elevados danos ao mercado? Será que, por causa disso, ficaram sob suspeita todos os estabelecimentos comerciais, industriais ou financeiros do país? É evidente que não. Por isso, não tem sentido que só as empresas de refeição-convênio sofram tal desconfiança.
O assunto precisa ser repensado e analisado profundamente. Imaginem o que aconteceria aos restaurantes, bares e similares -e mesmo a muitos supermercados- se, repentinamente, 6 milhões de clientes ficassem impedidos de frequentar esses estabelecimentos.
Quantos desses milhões de trabalhadores teriam que voltar à sua marmitinha caseira, sem poder aquisitivo para comer em restaurantes? Considerando que temos mais de 20 milhões de trabalhadores registrados no país e que pouco mais de 30% são beneficiados, como poderemos expandir essa atividade e aumentar o número de usuários se não forem dadas oportunidades de crescimento às pequenas e médias empresas do nosso setor?
O governo federal, quando instituiu esse benefício, em 1976, tinha como objetivo melhorar a qualidade da alimentação do trabalhador brasileiro e de seus dependentes. A prova de que a medida estava certa é o extraordinário crescimento dessa atividade nesses 20 anos. Logo, não é admissível que alguns empresários do setor de alimentação fiquem criando falsas ondas que podem voltar-se contra eles próprios.
Não tem sentido levar ao naufrágio um sistema que tanto tem contribuído para melhorar a nutrição de milhões de pessoas. Afinal, estamos todos -usuários, estabelecimentos conveniados e empresas de refeição-convênio- no mesmo barco.

Texto Anterior: A outra face do caso Dallari
Próximo Texto: EUA tem déficit de US$ 11,4 bi em junho
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.