São Paulo, domingo, 20 de agosto de 1995
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Apoio de personalidades `salva' militante negro

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

Entre os casos recentes que contribuem para o descrédito do tribunal do júri nos EUA está o do jornalista negro Mumia Abu-Jamal.
Abu-Jamal foi condenado à morte em 2 de julho de 1982, depois que um júri em Filadélfia (Costa Leste dos EUA) o considerou culpado pela morte de um policial que havia prendido seu irmão mais novo.
Uma arma pertencente a Abu-Jamal, que recebeu um tiro do policial, foi encontrada no local do incidente, mas nunca se estabeleceu com certeza se dela haviam saído as balas que o mataram.
O réu se defendeu sozinho porque não tinha dinheiro para contratar advogados e se recusou a ser assistido por um designado pela Justiça.
O juiz, Albert Sabo, desqualificou a autodefesa do réu e impôs a ele um advogado público que se afirmou relutante em aceitar o caso, mas o pegou.
Abu-Jamal havia sido militante do movimento radical Panteras Negras e até hoje mantém posições políticas consideradas de extrema esquerda.
Seu irmão se recusou a testemunhar no julgamento, ao que tudo indica por ter tido vários problemas com a lei por tráfico e consumo de drogas.
As duas outras testemunhas da acusação (uma prostituta e um motorista de táxi) também tinham várias questões pendentes com a Justiça e diversos motivos para serem simpáticos à promotoria.
Além disso, a identificação do criminoso feita pelo motorista esteve longe de ter sido conclusiva e o depoimento da prostituta foi tão incoerente que muitos suspeitam se ela assistiu mesmo ao tiroteio.
No corredor da morte, Abu-Jamal montou uma rede de contatos para apoiar sua reivindicação por novo julgamento.
Ele passou a ter um programa na rede pública de rádio e escreveu um livro que se transformou em best-seller.
Entre seus aliados estão os romancistas E. L. Doctorow, Norman Mailer, William Styron e Gunther Grass, a poeta Maya Angelou, os atores Paul Newman, Joanne Woodward e Susan Sarandon, os músicos Sting, Laurie Anderson, Bobby McFerrin e David Byrne, os cineastas Oliver Stone, Spike Lee e Terry Gilliam, o linguista Noam Chomsky e o zoólogo Stephen Jay Gould.
Dez dias antes da data marcada para sua execução por injeção letal, Abu-Jamal conseguiu que a sentença fosse suspensa até se decidir se ele pode ser julgado de novo e seus recursos chegarem à Suprema Corte.
A decisão, do mesmo juiz Sabo, que o condenara à morte e agora pertence a uma corte superior de Justiça, ocorreu depois de intensa mobilização no país e no exterior contra a execução do réu.
Se não tivesse vínculos com pessoas famosas, no entanto, Abu-Jamal a esta altura já estaria morto.
Muitos réus foram condenados à pena capital em processos até muito mais cheios de flagrantes ilegalidades do que o de Abu-Jamal e ninguém tomou conhecimento de seus casos.
(CELS)

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