São Paulo, domingo, 3 de setembro de 1995
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Setor imobiliário: via social e mão dupla

JÚLIO SINGER

Não foi por acaso que, há alguns dias, foi regulamentada a captação de recursos externos destinados ao setor imobiliário. Na verdade, desde o final do ano passado o governo vem dando mostras de preocupar-se com a revitalização desse segmento da atividade econômica, tendo em vista, por certo, o seu forte viés social.
O mais comum, quanto a esse último aspecto, é cingir a argumentação à capacidade da construção civil como ocupadora de mão-de-obra, sobretudo a não-especializada, contribuindo, assim, para a redução dos níveis de desemprego, que, por sinal, não se apresentam nada confortáveis nos grandes centros urbanos.
Ainda que verdadeiro em seu significado, tal argumento merece a companhia de outro, igualmente de conteúdo social, para continuar incentivando as autoridades no sentido de viabilizar, o mais breve possível, a recuperação desse setor de atividade.
Com efeito, tão importante quanto a oferta de empregos é o resgate da dignidade dos cidadãos, representada, entre outros fatores, pela disponibilidade de moradias. Não importa nem mesmo -em um primeiro momento- a questão de ser ela própria ou alugada. O que realmente interessa, de imediato, é fazer refluir o escândalo da habitação (?) subhumana que se registra no país.
A revitalização do setor imobiliário é, portanto, uma via social de mão dupla, ou seja: ao mesmo tempo em que gera renda, aumenta a oferta daquele que talvez seja o maior bem para o indivíduo, que lhe permite -e a sua família- viver com a dignidade da proteção de um teto.
A falência do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) não mais deixa dúvidas quanto a uma questão fundamental: o financiamento da construção civil terá de independer da ajuda governamental. O Estado é carente de recursos, e a pequena parcela disponível deverá ser dirigida a atividades igualmente urgentes do ponto de vista social. As soluções podem e devem ser encontradas pelo setor privado, cabendo às autoridades apenas a oferta de ambiente regulatório e, eventualmente, incentivos adequados.
A bem da verdade, diversas entidades e instituições privadas estão, neste exato momento, trabalhando arduamente para o "desenho" de uma nova estrutura de financiamento do setor imobiliário, que se assenta no surgimento efetivo das companhias hipotecárias -já regulamentadas pelo Conselho Monetário Nacional-, na criação de uma agência securitizadora e na dinamização dos mercados primário e secundário para a negociação de títulos direta ou indiretamente vinculados aos financiamentos concedidos.
O sistema proposto simplifica, na prática, o processo por meio do qual hipotecas geradas no financiamento imobiliário se transformam em títulos negociáveis com transparência e segurança, atendendo a necessidades de investidores finais, notadamente os institucionais, como fundos de pensão.
Outra característica essencial é que em todas as suas etapas observa-se a presença do mercado segurador, garantindo desde a execução de obras até os próprios créditos concedidos. Trata-se, em síntese, de um mecanismo criativo e eficiente, totalmente privado. Do governo, espera-se, apenas, apoio institucional.

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