São Paulo, domingo, 10 de setembro de 1995
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Boa aparência

DEMIAN FIOCCA

Depois do resultado favorável de agosto, a tendência da inflação é de queda em setembro, a menos que ocorra um reajuste de tarifas públicas (energia elétrica, combustíveis).
A estagnação da economia ajudou a equilibrar a balança comercial (exportações e importações). O IOF sobre a entrada de capitais estancou a acumulação excessiva de reservas externas.
Os resultados da política econômica seriam bastante satisfatórios se não estivessem custando os olhos da cara e iniciando uma trajetória de desemprego crescente.
Com o que se gasta de juros com a dívida pública, daria para pagar todos os aposentados e ainda aumentar em 1/3 (em vez de diminuir, como quer o governo) a concessão de aposentadorias. Isso, sem cobrar das empresas e dos assalariados sequer um centavo de contribuições ao INSS.
O custo anual dos juros está na casa dos R$ 50 bilhões. A previsão de gastos com a Previdência Social é de R$ 33 bilhões.
Em seu discurso de há duas semanas, porém, o presidente disse que o custo dos juros reais da dívida pública era de R$ 15 bilhões ao ano. Luiz Carlos M. de Barros estimou-os em R$ 17 bilhões. Essas somas, já impressionantes, não se referem à quantidade dos reais que o governo gasta de fato com os juros. Trata-se de uma abstração, do cálculo do que seriam os juros reais, acima da inflação.
Para avaliar o peso da política monetária, entretanto, é mais correto utilizar o valor nominal, sem descontar a inflação. Isso porque o que interessa é compreender o peso relativo de cada gasto. E, hoje, todos os demais gastos públicos são expressos em termos nominais.
Sobre uma dívida de R$ 80 bilhões, por exemplo, juros de 3,5% ao mês custam R$ 2,8 bilhões. Se a inflação for de 2%, os que fazem o cálculo real ignorarão R$ 1,6 bilhão que foram desembolsados e dirão que no mês o governo gastou de juros apenas R$ 1,2 bilhão (1,5% de R$ 80 bilhões). Mas o primeiro R$ 1,6 bilhão é tão verdadeiro quanto o segundo R$ 1,2 bilhão. E tão verdadeiro quanto os R$ 100 que recebe o aposentado.

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