São Paulo, terça-feira, 19 de setembro de 1995
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Che enfrentou magia tribal

JOSÉ GERALDO COUTO
DA REPORTAGEM LOCAL

"O Ano que Vivemos em Lugar Nenhum" é um trabalho histórico-jornalístico exemplar. A partir dos depoimentos de 20 participantes diretos, mais algumas cartas, reconstitui tão minuciosamente quanto possível a participação cubana -sobretudo do "comandante" Che Guevara- na guerrilha revolucionária no Congo em 1965.
Nessas memórias a muitas vozes, a voz que se destaca, obviamente, é a do próprio Che. Lidos 30 anos depois, os textos de seu manuscrito ganham uma densidade trágica e, por vezes, patética.
A imagem quixotesca do guerrilheiro é reforçada por sua perplexidade diante da confusão africana, sua impotência ao tentar encaixar uma realidade que lhe escapava à compreensão nos esquemas lógicos do marxismo-leninismo.
Há no livro momentos pitorescos, como por exemplo o feitiço a que os guerreiros africanos se submetiam antes dos combates, para "fechar o corpo", ou as escaramuças dos guerriheiros cubanos com os bichos da selva.
Outras passagens interessantes são as que contam as dificuldades do Che (que era médico) para implantar condições mínimas de higiene e saúde entre seus homens.
É comovente o esforço do comandante (que estava incógnito, careca e sem barba) em aprender a língua swahili, passando noites em claro no acampamento.
Mais emocionante ainda é ler o relato de como o Che recebeu a notícia da morte de sua mãe e, em seguida, a última carta dela.
Se a revolução comunista foi uma quimera, pelo menos produziu algumas das mais belas trajetórias humanas de nosso século. A de Che Guevara foi uma delas.

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